sábado, 16 de julho de 2011

DIREITO CANÔNICO - PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO

O Cânon 50 e o Procedimento Administrativo entre eficácia e garantia
(apresentação da dissertação doutoral)



Caríssimos e ilustres colegas canonistas,

I. O objeto do estudo

Desde já expresso minha gratidão pela atenção que dispensam à exposição a que dou início. O tema é certamente árido, o objeto da exposição desperta interesse em quem tem interesses específicos no direito administrativo e no estudo das relações entre a autoridade eclesiástica e os fiéis. Posso adiantar que o interesse do tema é visitar na história do cân. 50 o desenvolvimento de uma norma que regula o exercício da autoridade, indicando modos concretos de viver a prudência ao tomar decisões ou ao prover o bem comum da comunidade eclesiástica.
Conta-se de São Bernardo. Durante um conclave chegou-se a um impasse; havia três candidatos: um muito santo, outro muito sábio e um terceiro muito prudente. Ao Santo Abade de Claraval perguntaram a quem se deveria eleger. Ao que ele respondeu: “Si sanctus est, oret pro nobis; si sapiens est, doceat nos; si prudens est, regat nos”: “Se é santo, que interceda por nós a Deus; se é sábio que nos instrua; se é prudente, que nos governe”.
O bom governo eclesiástico, requer portanto o exercício da virtude da prudência, que é o hábito de escolher os meios melhores e mais aptos para se alcançar um determinado bem, subordinado à salus animarum.
A Igreja, Mãe e Mestra, no seu ordenamento jurídico procura dar parâmetros jurídicos, técnicas, instituições, que mantenham a atuação da autoridade no âmbito da prudência ou do bom governo. Os vínculos jurídicos são o que chamamos princípio de legalidade e as margens de avaliação prudencial são o que chamamos discricionariedade: que no código aparece sob as expressões: pro prudenti iudicio, prudenti arbitrio, etc.
É no procedimento de tomada de decisões que o sujeito investido de autoridade fica vinculado a certas operações de caráter cognitivo, que lhe consentirão avaliar e formar a vontade institucional da entidade que governa. Este é o objeto do estudo.
A dissertação, que foi apresentada junto da Pontifícia Universidade da Santa Cruz, em Roma, desenvolve-se em torno da história da formação do cânone 50 do Código de Direito Canônico, que assim reza: “Antes de baixar um decreto singular, a autoridade colha as necessárias informações e provas, e, na medida do possível, ouça aqueles cujos direitos possam ser lesados”.
A redação da norma é evidentemente muito lacônica, mas estabelece lindes procedimentais onde canalizar o exercício do poder discricionário do administrador eclesiástico. Por isso, o cân. 50 é mencionado em conexão com o procedimento administrativo já na primeira parte do título da dissertação “o cân. 50 e o procedimento administrativo...” como objeto material do estudo.

A segunda parte do título “... entre eficácia e garantia...” ressalta duas perspectivas concorrentes na doutrina e na praxe do procedimento administrativo: a eficácia e a garantia precisamente.
Embora – como veremos mais adiante – a perspectiva da garantia tenha sido predominante na história da formação deste cânone, o interesse do meu estudo era o de tratar o procedimento administrativo na perspectiva da eficácia, também chamada de produção. Esta perspectiva está no centro das investigações feitas e constitui o objeto formal da minha dissertação. Em outras palavras, nesse trabalho se estuda a norma referente ao procedimento de formação do ato administrativo singular ou – como o chama a doutrina italiana – provedimento administrativo, norma esta que está contida no cânone 50 do Codex Iuris Canonici.


II. Motivos da escolha do tema


Permitam-me uma breve digressão antes de entrar propriamente no mérito do trabalho em questão.
Um trabalho científico tem a característica de se apresentar como uma investigação sobre um determinado tema com critérios de objetividade científica, ou seja, fundada sobre documentos, sobre dados históricos documentáveis e com critérios de lógica interna. No entanto, não existe uma objetividade absoluta. O sujeito que investiga é uma pessoa concreta situada num determinado contexto geográfico, histórico e com um arcabouço cultural. Por esta razão, na sua formação intelectual já tem bem assimilada uma série de conceitos e pré-conceitos (no sentido de conceitos prévios). Ele é, portanto, é influenciado pela biografia, pelo “background” cultural ou ideológico, quer na escolha do objeto de investigação quer do modo de abordá-lo.

Por quais razões escolhi este tema? Dentre todas as razões, parece-me que a primeira razão é a biográfica.
A infância e a juventude, eu as vivi no contexto da ditadura militar brasileira (1964 1984). O contexto do regime repressivo e autoritário em que se deu toda a minha formação cultural da infância à juventude, suscitou inicialmente um excessiva estima do sentido da autoridade. Mas como o poder, especialmente se exercido de modo arbitrário, desgasta tanto os que o têm quanto os que o sofrem, (il potere logora sia quelli che ce l'hanno sia quelli che lo subiscono), já nos anos mais próximos do fim da ditadura as muitas incongruências do regime militar despertaram alguns questionamentos aos quais não podia me furtar. Os generais-presidentes usavam com muita ligeireza atos substancialmente administrativos para modificar até mesmo a Carta constitucional, sempre mortificando gravemente os direitos e as liberdades fundamentais dos cidadãos.
Com os movimentos estudantis e operários iniciados nos últimos anos da década de 70 em protesto contra a repressão, aprendi – certamente de modo não muito elaborado – a importância da promoção dos direitos da pessoa e da liberdade de expressão, juntamente com o anelo, a aspiração por novas formas de governo mais participativas e atentas às verdadeiras necessidades da comunidade. Sobretudo cresceu em mim uma forte aversão ao autoritarismo de qualquer cor e, contemporaneamente, um grande interesse pelas formas corretas e justas de exercício da autoridade.
Muitos anos mais tarde, já sacerdote, vi-me a estudar direito canônico no então chamado Ateneu Romano da Santa Cruz – hoje Pontifícia Universidade da Santa Cruz. Dentre os ramos do direito canônico, imediatamente me senti atraído pelo direito administrativo, em particular pelo tema da discricionariedade administrativa, do exercício do poder discricionário no governo da Igreja.
Ao pedir ao Professor Arrieta que me orientasse na pesquisa e na preparação da tese doutoral, manifestei-lhe logo o meu entusiasmo. Ele prontamente me disse que o assunto, apesar de apaixonante, era demasiado amplo. E abrindo o Código de Direito Canônico me fez ler o comentário de Pedro Lombardía ao cân. 50 e me disse que aquela norma raquítica poderia concentrar a investigação sobre os mecanismos de controle da discricionariedade no direito canônico.
Confesso que fiquei decepcionado com a contraproposta, porque desejava estudar o tema da discricionariedade in recto. A indicação do orientador eleito pareceu-me um balde de água fria nas minhas pretensões intelectuais, porque me faria dar voltas ao redor do tema que eu tinha escolhido com paixão. Mais tarde me apercebi da enormidade do meu desejo e me apaixonei pelo tema do procedimento administrativo, que se tornou o verdadeiro leitmotiv do meu estudo.


III. Início da pesquisa


Para introduzir-me no tema, comecei a estudar a história do conceito de discricionariedade na dogmática jurídica da Europa continental, deixando de lado a tradição do Common Law, com o qual tive de me embater mais tarde.
Este estudo preparatório foi-me de grande utilidade para entender em qual ambiente de cultura jurídica tiveram origem os projetos legislativos canônicos que levaram à redação do atual cân. 50, o qual não tinha precedente algum no Código Pio-Beneditino.
Em 1994, comecei a trabalhar no Conselho Pontifício para os Textos Legislativos, onde se encontra até hoje todo o arquivo da Pontifícia Comissão para a Revisão do Código de Direito Canônico, onde tive acesso aos documentos originais dos esquemas preparados eplo Grupo de estudos De Procedura Administrativa.
O acesso a este arquivo deu-me a oportunidade única de publicar no corpo da dissertação uma documentação que – a meu modo de ver – será muito útil para futuras pesquisas não só sobre o procedimento administrativo, como também sobre a justiça administrativa na Igreja.
A motivação acadêmica do tema da tese uniu-se à paixão adquirida pelos procedimentos administrativos: um assunto certamente interessante para os que trabalham na área, mas também para quem tem a peito o bom governo na sociedade eclesial, no equilíbrio entre discricionariedade e a legalidade.

IV. A Doutrina

O desenvolvimento de um corpo normativo orgânico e geral sobre o procedimento administrativo, ou mesmo de códigos de procedimento administrativo, responde à necessidade de promover a harmonia da paz na sociedade mediante a atuação justa e prudente por parte das autoridades. Assim se procura prevenir ou por remédio aos conflitos eventualmente surgidos no desempenho da função de gestão da coisa pública. O procedimento representa, sobretudo para a função de governo, um modo de atuar que requer da parte do administrador a combinação de dados cognitivos com o exercício da prudência no ato de tomar decisões ou de prover ao bem público do corpo social que ele deve governar.
O mistério da encarnação e a historicidade da comunidade eclesial requerem que os seus Pastores, ao governá-la, além dos meios sobrenaturais – sempre necessários –, empreguem também os instrumentos técnicos adequados para assegurar o mais possível que as relações entre governantes e governados se desenrolem segundo a justiça, que está na base da verdadeira caridade.
Os Sagrados Pastores devem, portanto, valer-se também dos instrumentos técnicos fornecidos pela ciência da administração e pelo direito para prover ao bem das almas. Nesse contesto, o procedimento administrativo, ainda que não formalizado em normas jurídicas específicas, é o modo ordinário de atuar no governo da Igreja.
É prudente o administrador que, antes de decidir ou prover em relação a alguma concreta necessidade da comunidade, verifica a própria competência, recolhe as necessárias informações, pede os conselhos e pareceres técnicos oportunos, e empregue tempo para refletir e, ponderando os interesses em jogo, provê com a margem de discrição deixada pelos vínculos jurídicos teleológicos da sua função pública.
As normas sobre o procedimento administrativo não são nada mais do que a formalização do modo de proceder para fornecer ao administrador as lindes juridicas para o exercício do seu poder discricionário. Tais normas, de alguma maneira, impoem a cognição da realidade e do quadro normativo de referência, exigem avaliações e ponderações, tempos de reflexão para o exercício daquilo que se poderia chamar “prudência institucional”. Deste modo, é possível prevenir decisões injustas ou iníquas, prover ao bem comum com o mínimo prejuízo para a esfera jurídica dos eventuais particulares interessados.

No pensamento jurídico contemporâneo, tem se perfilado de modo não raro muito fecundo um intenso debate sobre o tema do procedimento, na medida em que o procedimento se tornou uma categoria quase indispensável em diversos ramos da ciência jurídica. A sua presença prepotente no Direito Público, mas também, não raro, no Direito Privado, revestiu, sobretudo após a Segunda Grande Guerra, uma tal importância que tem sido qualificada como uma “preocupação quase obsessiva”, ou a criticada e excessiva “euforia procedimental”.
O debate sobre o tema dos procedimentos no âmbito jurídico oscilado entre dois excessos: a subestimação ou desprezo e a superestima eufórica (R. Wahl, 1989). De um lado a falta de formalização que expõe ao risco do exercício arbitrário do poder administrativo ou executivo, suscitou em muitos o desejo de vincular ao máximo a atuação do administrador. Doutro lado, havia os que eram avessos à excessiva vinculação do administrador. Estes argumentavam dizendo que as normas demasiado vinculantes expõem a administração pública ao risco de se enrijecerem ou de ficar amarradas a um leito de procuste, na medida em que tolhe ao administrador a discricionariedade que lhe permite uma atuação célere em vista do bem público que não se pode adiar ad kalendas grecas.

A construção dogmática e teorética do procedimento administrativo apareceu inicialmente como resultado dos esforços no âmbito do controle dos atos administrativos. A figura do procedimento administrativo que se desenvolveu em virtude das exigências de tutela não era nada mais do que o ato administrativo examinado retrospectivamente (Berti). Esta perspectiva de formulação do conceito e das normas do procedimento administrativo, a partir do ponto de vista jurisdicional, tem sido chamada por muitos perspectiva de imputação ou patológica. Esta deu origem a diversas figuras de patologias do ato administrativo, identificadas pela jurisprudência na fase preparatória da decisão ou do provedimento e tendia à regulamentação do procedimento de modo semelhante ao processo, com o incremento de elementos garantisticos na fase instrutória.
Mais tarde, veio a desenvolver-se uma outra perspectiva, em sentido oposto, chamada de produção: o procedimento é considerado como o modo de ser da Administração e o modo de realizar-se do direito administrativo ou ainda o fazer-se do ato administrativo. Esta perspectiva põe de manifesto o aspecto teleológico do procedimento administrativo, na medida em que este tende principalmente à satisfação dos interesses públicos (M. S. Giannini, 1970).
No campo do DIREITO CANÔNICO, o estudo do procedimento e dos respectivos projetos normativos advindos depois do Concílio Vaticano II, partiu prevalentemente da perspectiva de imputação. Efetivamente o projeto De Procedura Administrativa foi levado a cabo com a finalidade de dar um quadro legal apto para a administração da justiça administrativa a Sectio altera do Supremo Tribunal da Assinatura Apostólica, Secção esta erigida como tribunal administrativo da Igreja Catolica.
Contudo na elaboração do projeto, constatada a séria lacuna normativa concernente ao ato administrativo em geral, viu-se a necessidade de elaborar algumas normas gerais e orgânicas sobre o procedimento de formação do provedimento administrativo, enquanto ato impugnável.

V. A Tese

O objeto do estudo, como disse no início, é a normativa concernente ao procedimento administrativo contida no cânon 50.
O estudo da história da norma procedimental espelha de modo prevalente a perspectiva de produção do ato administrativo, procurando extrair não tanto as suas eventuais patologias, mas aqueles elementos normativos referentes ao exercício do poder administrativo em vista do bem comum da sociedade eclesiástica. Em outras palavras, se ressaltam os aspectos procedimentais que regulam a ação do administrador na medida em que ele procure satisfazer o bem público com o menor prejuízo da esfera jurídica dos administrados.
Esta perspectiva faz evidenciar a dimensão funcional ou a índole diaconal da autoridade na Igreja. Levar-se-á em conta o aspecto garantístico na medida em que a autoridade tem o dever institucional formalizado no Código de 1983 de promover os direitos dos fiéis.
Efetivamente o bem público da Igreja se identifica em última análise com a salus animarum, que compreende também a salvaguarda da posição jurídica de cada um dos fiéis na história e a generosa administração dos bens próprios da Igreja em vista da salvação eterna de cada fiel singularmente tomado.

No primeiro capítulo se faz um estudo histórico do tema do procedimento administrativo na doutrina e na normativa canônica desde a “Sapienti Consilio” até o Con-gresso Internacional dos Canonistas de 1968. Este estudo se volta a uma melhor compreensão do ambiente jurídico e também ideológico em que o Coetus De procedura administrativa começou a trabalhar sobre o projeto a ela confiado pelo Legislador universal.
Do segundo capítulo em diante, o método empregado é o da análise e descrição do iter de cada cânone presente sob o título De decretis extra iudicium ferendis, dos sucessivos esquemas De Procedura administrativa.
O segundo capítulo examina a origem e os primeiros trabalhos do Parvus Coetus De Procedura Administrativa. Este reduzido grupo de estudos nasceu em 1969 no seio do Coetus De processibus, para responder à exigência de produzir um projeto de normas para ordenar a justiça administrativa que deveria depois vir a confluir no projeto mais amplo do Livro sobre os processos.
O esquema prévio preparado por este grupo ficou substancialmente intacto no decorrer das várias sessões de estudo. Alguma modificação mais significativa veio a aconteder após a transformação do Parvus Coetus em uma nova comissão especial formada após o estudo dos dois projetos pelas Conferências episcopais estadunidense e bávara.
O terceiro capítulo toma em exame os sucessivos esboços do projeto de lei sobre a justiça administrativa preparados pela nova comissão, integrada por membros do Parvus coetus de procedura administrativa e por canonistas indicados pelas duas conferências episcopais (americana e alemã), bem como por varios oficiais da Cúria Romana. Trata-se de fato de um projeto de justiça adminstrativa para a Igreja que se deve promulgar antes mesmo do Código de Direito Canônico. Chegou a ser acabado um projeto de Motu proprio intitulado Admni¬strativae potestatis, que o Papa Paulo VI houve por bem não promulgar. Não consta nos autos os motivos desta decisão.
No quarto capítulo nos ocupamos das normas do projeto abandonado de Motu proprio referentes ao procedimento de formação do ato administrativo que serão recolhidas nos respectivos livros do futuro Código de Direito Canônico. Faz-se também uma sucinta comparação com as normas que o Código dos Cânones das Igrejas Orientais tomou do esquema De Procedura administrativa de 1972.
Aqui se entrevê como o quadro normativo do Código oriental, nesta matéria, poderia se tornar um útil critério para preencher as lacunas normativas do ordenamento latino. Certamente juntamente com os critérios indicados pelo cân. 19 do CIC.

Conclusão: O que o estudo trouxe à luz?

O estudo serviu em primeiro lugar para evidenciar – como o tem feito de modo muito crítico boa parte da doutrina contemporânea – que o Legislador não quis dar uma regulamentação orgânica, clara e completa do modus procedendi da autoridade administrativa eclesiástica na produção dos provedimentos administrativos.
No que tange o cân. 50, ele deve ser lido e interpretado levando em conta a sua origem não só próxima como também a origem remota. Efetivamente a perspectiva que dominou o pensamento e o trabalho do grupo de consultores encarregado de preparar as normas que estavam na raiz deste cânone foi a de imputação ou patológica. Assim o ato administrativo que brota do procedimento regulamentado pelo cân. 50 è bem mais o ato impugnável do que o ato de cumprimento da função administrativa no caso concreto.
No entanto, embora sendo dominante entre os consultores a sobredita perspectiva de imputação, durante os trabalhos do coetus os consultores tomaram o cuidado de não multiplicar as normas de garantia, ao menos em sentido estritamente vinculante. Parte dos consultores tinha como preocupação de fundo evitar transpor as formalidades típicas do processo judiciário ao procedimento administrativo. A tutela dos direitos dos fiéis deve, com efeito, ser balanceada com a eficácia da administração publica eclesiástica.
Uma normativa excessivamente marcada pela exigência de garantia teria tido o indesejado efeito de paralisar a administração ou pelo menos de privá-la daquela elasticidade que é tão útil na sua atuação.
O cân. 50, no Código de Direito Canônico é a única norma geral sobre o procedimento administrativo, não referente a procedimentos específicos. Ele prescreve à autoridade alguns passos prévios à emissão do provedimento. Em primeiro lugar a autoridade deve procurar as noticias e provas necessárias. É evidente que qualquer decisão ou provedimento requer que a realidade sobre a qual se quer agir seja conhecida. Mas aqui a norma finalmente promulgada exige que tal conhecimento seja devidamente documentado, ainda que caiba ao mesmo administrador avaliar a necessidade ou não das notícias e provas. Em segundo lugar, o cânone prescreve ouvir aqueles cujos interesses possam ser lesados, mas a cláusula quantum fieri potest deixa ao administrador uma grande liberdade de apreciação e de ação.

De tudo isto emerge a necessidade de pôr conveniente remédio ao fato de esta norma geral não ser completa. Antes de mais nada, recorrendo aos critérios da moral administrativa (a prudência aplicada à atividade de governo), da deontologia dos profissionais do direito que atuam na administração pública, da ciência da administração, entre outras, que podem ajudar a integrar a etapa de formação dos provedimentos administrativos.
Até mesmo o Legislador quis oferecer no cân. 19 do CIC os remédios oportunos para preencher as lacunas: recorrer às leis dadas para casos semelhantes, os princípios gerais do direito aplicados com equidade canônica, a jurisprudência e a praxe da Cúria Romana, assim como o modo de sentir comum e constante dos juristas. Nesse sentido o administrador pode apoiar-se em outras normas procedimentais do Código Latino como também no Código dos Cânones das Igrejas Orientais, que poderia ajudar a realizar uma integração eficaz dos procedimentos do Código de Direito Canônico.
Nada impede que o Bispo diocesano, enquanto legislador na própria diocese, estabeleça normas orgânicas, claras e gerais sobre o modo de proceder na Curia diocesana no que diz respeito à formação dos provedimentos administrativos.
Enfim, mesmo reconhecendo a necessidade dos recursos e dos processos importantes no contexto da justiça administrativa, considero que o estudo do procedimento administrativo na perspectiva da produção do ato, mais do que na perspectiva da patologia ou da imputação, resulta bem mais eficaz e educativo, sob vários pontos de vista. O controle preventivo do uso do poder discricionário – como também o autocontrole por parte da autoridade – deve ser significativo no curso da instrução do procedimento com exigência do bom governo Pastoral.
A existência das normas e a sua observância exemplar pelos Pastores, favorece a prevenção em relação aos mesmos Pastores da grave acusação feita por Tertuliano aos magistrados imperiais: "Prevaricaris in leges" – Prevaricais contra as vossas próprias leis. Quando se observam as normas jurídicas, elas têm o condão de envolver a vida do corpo social em caminhos seguros, permanentes e adequados. São um modo eficaz de prevenir a improvisação e favorecem a tutela dos direitos subjetivos. E quando a atuoridade – quer seja civil quer seja eclesiástica – se submete às leis, a mesma autoridade se faz mais amável e torna a obediência atraente.

Londrina, 14 de julho de 2011.

Mons. Dr. José Aparecido Gonçalves de Almeida
Subsecretário do Pontifício Conselho para os Textos Legislativos

(*)Palestra de partilha de tese de doutoramento proferida em LONDRINA - PR, no XXVI ENCONTRO DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE CANONISTAS e XXVIII ENCONTRO DOS SERVIDORES DOS TRIBUNAIS ECLESIÁSTICOS DO BRASIL.

DIREITO CANÔNICO - OS BENS ECONÔMICOS DA PARÓQUIA E O CONSELHO PAROQUIAL PARA OS ASSUNTOS ECONÓMICOS

"OS BENS ECONÔMICOS DA PARÓQUIA
E O CONSELHO PAROQUIAL PARA OS ASSUNTOS ECONÔMICOS"(*)
(cânn. 531-532; 537; cfr. cânn. livro V)

As normas referentes ao ordenamento econômico da paróquia estão contidas nos cânn. 531-532; 537 . Estas normas específicas devem, porém, ser comple¬tadas com aquelas mais gerais contidas nos cânones do livro V.
A seguir veremos: o sistema de retribuição econômica dos ministros sagrados na paróquia (cân. 531; cfr. cân. 551) (par. 11.1); a representação jurídica da paróquia (cân. 532; cfr. cân. 543, § 2, n. 3) (par. 11.2); o conselho paroquial para os assuntos econômicos (cân. 537) (par. 11.3).

11.1 O sistema de retribuição econômica dos ministros sagrados na paróquia (cân. 531; cfr. cân. 551)


« Ainda que outrem haja desempenhado algum múnus paroquial, as ofertas que por esta ocasião recebe dos fiéis entregue-as ao fundo paroquial, a não ser que conste da vontade contrária do oferente no que respeita às ofertas voluntárias; ao Bispo diocesano, ouvido o conselho presbiteral, compete estabelecer as prescrições com que se providencie ao destino destas ofertas e ainda à remuneração dos clérigos que desempenhem o mesmo ministério » (cân. 531).
a) Para compreender as palavras do Código: « Ainda que outrem haja desempenhado algum múnus paroquial, as ofertas que por esta ocasião recebe dos fiéis entregue-as ao fundo paroquial », é necessário recorrer ao cân. 530, não porém na forma atual, mas na forma originaria, ou seja, na do Schema 1977, cân. 363, onde se tratava das funções « que o pároco deve cumprir pessoalmente ». Norma — como já disse (cfr. capi-tolo 4, par. 4.7.2, d) — contida no Código precedente sobre as « funções reservadas ao pároco » (cfr. cân. 462).
De fato a sobredita norma da reserva de funções ao pároco tinha importância também econômica. O Código pre¬cedente falava, com efeito, das « funções reservadas ao pároco » porque a renda destas competiam somente do pároco, ainda que as funções in questão tivessem sido desempenhadas por outros ministros na paróquia; excetuavam-se as somas ofertadas à pessoa do celebrante além da espórtula ou a título diverso da atividade in questão.
b) No novo Código, ou seja, no cân. 531, a coisa muda, e profundamente. As somas provenientes da atividade litúrgica devem, efetivamente, ser entregues não à pessoa do pároco, nem de um outro ministro, mas à caixa paroquial; devem portanto ser conferidas não aos ministros enquanto pessoas físicas, mas à paróquia mesma, enquanto pessoa jurídica. O testo do cânon afirma, ademais, ao menos implicitamente, que do fundo paroquial, ou seja, dos bens da paróquia come pessoa jurídica, se retiram as somas necessárias para a remuneração dos ministros sagrados, isto é do pároco e dos demais *.
c) Importa ainda prestar atenção às palavras do cân. 531: « [...] ao Bispo diocesano, ouvido o conselho presbiteral, compete estabelecer as prescrições com que se providencie ao destino destas ofertas e ainda à remuneração dos clérigos que desempenhem o mesmo ministério ».
Quais são « estas ofertas »? O texto do próprio cânon que precede as palavras ora citadas fala quer das ofertas dadas por ocasião do cumprimento dos encargos paroquiais, quer de ofertas voluntárias, isto é, dadas não por ocasião do cumprimento dos sobreditos encargos, mas de modo espontâneo . Não creio que as ofertas voluntárias devam ser entregues ao fundo paroquial, mesmo que isto seja possível, nem creio que o Bispo diocesano deva estabelecer alguma coisa em propósito. Creio, porém, que o Bispo diocesano deva emitir apenas as normas referentes ao fundo paroquial e à retribuição dos ministros sagrados, com as somas tiradas do mesmo fundo .
d) E disto deriva uma última observação. O Código efetivamente afirma, pelo menos implicitamente — como já salientei acima —, que se devem retirar da caixa paroquial as somas necessárias para a remuneração dos ministros sagrados, ou seja, do pároco e dos demais.
Disto podemos notar que no novo Código a remu¬neração dos ministros sagrados configura uma relação que se dá não mais, come no Código precedente, entre o fiel, que frui da função sacra, e o pároco, que celebra a mesma função, mas entre a paróquia pessoa jurídica e os ministros adidos a ela.
Nem devemos esquecer o cân. 1274, § 1, que prevê o sistema de sustentação dos clérigos e contudo pre¬cisa: « [...] a não ser que já se tenha providenciado de outra forma ».


11.2 A representação jurídica da paróquia (cân. 532; cfr. cân. 543, § 2, n. 3)

« Em todos os negócios jurídicos, o pároco representa a paróquia, nos termos do direito; vele por que os bens da paróquia sejam administrados nos termos dos cânn. 1281-1288 » (cân. 532).
a) « Representar a paróquia » significa representá-la « juridicamente » (cfr. cân. 118), isto é — como se expressa o texto — nos « negócios jurídicos », ou seja, naqueles atos que modificam a posição jurídica, como são as disposições patrimoniais.
« Nos termos do direito » pode indicar em particular o fato de que o representante jurídico não pode agir sempre e sozinho por sua autônoma vontade, mas às vezes deve obter o consentimento, às vezes o conselho de outros sujeitos (cfr., por ex., os cânn. 127; 129lss).
No caso do grupo de sacerdotes que governam in solidum uma paróquia, « em assuntos jurídicos só o moderador representa a paróquia ou conjunto de paróquias que foram confiadas ao grupo » (cân. 543, § 2, n. 3).
Contudo, é necessário salientar que a representação jurídica da paróquia não pode e não deve limitar-se àqueles atos jurídicos, sobretudo de natureza patrimonial, a que tínhamos aludido, mas falando de modo mais amplo, podemos dizer que o pároco representa a paróquia com personalidade — come se sói dizer — corporativa, de modo que, quando age o pároco, nele age a paróquia (cfr. capítulo 2, par. 2.3.5).
b) Não entendo perfeitamente as palavras cânon: « vele por que os bens da paróquia sejam administrados nos termos dos cânn. 1281-1288 ». Por que se refere somente a estes cânones? A disposição não deveria referir-se a todo o Livro V? Por que, por ex., não se citam os cânn. 1290-1298 sobre os contratos; ou os cânn. 1299-1310 sobre as vontades pias?

11.3 O conselho paroquial para os assuntos econômicos (cân. 537)

« Em cada paróquia haja um conselho para os assuntos econômicos, o qual se rege pelo direito universal e pelas normas dadas pelo Bispo diocesano, e em que os fiéis, escolhidos segundo as normas, auxiliem o pároco na administração dos bens da paróquia, sem prejuízo do prescrito no cân. 532 » (cân. 537).
Acerca deste instituto surgem as seguintes questões.
a) Antes de tudo, por que o Código fala deles? não é um tema inútil? Na verdade, pelo fato de que a paróquia é pessoa jurídica e pelo fato decorrente de que toda pessoa jurídica deve ter o conselho para os assuntos econômicos (cfr. cân. 1280), porque isto é especificamente afirmado a propósito da paróquia? Não deveria ser simplesmente subentendido? . Assim pareceria. Veja-se, porém, quanto se especifica na observação seguinte acerca da natureza própria deste conselho paroquial.
b) Em segundo lugar: como precisamente se deve conceber o predito conselho? As soluções são duas:
aa) o conselho é formado por fiéis e pelo pároco; tal conselho, pois, à maneira de sujeito unitário, delibera os atos administrativos; é, por isso, administrador da paróquia;
bb) o conselho é formado apenas pelos fiéis e dá conselhos ao pároco, que, sozinho, delibera os atos administrativos; o conselho é somente uma comissão de expertos; o pároco é o administrador único.
Qual é a solução correta? Do teor das expressões do cân. 537: « auxiliem o pároco », resulta correta a segunda concepção: o conselho para os assuntos econômicos oferece conselhos a outro sujeito, ou seja, precisamente ao pároco (« auxiliem o pároco »), que é então o único deliberante e, portanto, o único administrador .
Se ora chamamos à mente o já citado cân. 1280, que prevê duas possibilidades, isto é, o conselho de admini¬stração ou ao menos dois conselheiros que ajudem o administrador da pessoa jurídica, esta segunda possibili¬dade se verifica precisamente na paróquia: um único ad¬ministrador, ou seja, o pároco, com o auxílio de alguns conselheiros, isto é, do conselho para os assuntos econômicos.
c) A terceira pergunta respeita o sentido da parte final do cân. 537: « sem prejuízo do prescrito no cân. 532 ». Por que tal acréscimo? Talvez porque a primeira prescrição sobre o conselho para os assuntos econômicos poderia enfraquecer a segunda, isto é, que o pároco representa a paróquia e deve cuidar que os bens da paróquia sejam admini¬strados nos termos dos cânones do livro V? Não parece possível alguma contradição entre as duas normas. Mesmo no caso em que o administrador da pessoa jurídica não é úni¬co, mas é um conselho de administração, há sempre uma pessoa física que é o representante legal da pessoa jurídica mesma.
Mas, talvez, na subjacente à intenção do cân. 537 esteja o temor de que se possa entender o conselho para os assuntos econômicos come um instituto que limita o poder do pároco na administração da paróquia e por isso opera invoca o disposto no cân. 532; mas esta invocação nos parece incongruente.
Note-se, em todo caso, que o texto provém da Comis¬são (cfr., supra a nota 6), em que o conselho era concebido como administrador (dos bens paroquiais e o recurso ao cân. 532 tinha as suas razões: o conselho administre de acordo com as normas do livro V, ao passo que somente o pároco representa legalmente a paróquia.
d) Quarta questão: que hipóteses de relações podemos estabelecer entre o conselho para os assuntos econômicos e o conselho pastoral paroquial?
aa) é bem evidente que não são a mesma coisa. Isto se deduz com facilidade quer do texto do Código, quer da di¬versa finalidade, quer da diferente composição, quer enfim da diferente obrigatoriedade dos dois conselhos.
Iniciando pela diferente obrigatoriedade, a diferença con¬siste nisto: o conselho pastoral paroquial não é obrigatório em virtude da norma do Código, mas se torna obrigatório pela deliberação do Bispo diocesano, de modo que, se o Bispo delibera por tal obrigatoriedade, o conselho se torna obrigatório para cada paróquia da diocese; o conselho para os assuntos econômicos, pelo contrário, é obrigatório para cada paróquia já por força da norma do Código. O pároco deve pois constituí-lo. Se não o constituir, os fiéis podem recorrer à autoridade do Bispo, denunciando a inércia do pároco e requerendo a intervenção do próprio Bispo.
Diferente é a finalidade dos dois conselhos paroquiais: a do conselho pastoral se estende a todas as questões referentes à condução da paróquia (« prestam a sua ajuda na promoção da ação pastoral », come diz o cân. 536; a do outro conselho se limita às questões administrativas (« auxiliem o pároco na administra¬ção dos bens da paróquia », come recita o cân. 537).
Diferente é a composição. Isto, no entanto, não se colhe somente das indicações do Código, que se revelam insuficientes, mas da diferente finalidade: mentre infatti no conselho pastoral « na promoção da ação pastoral » podem participar de per si todos os componentes da paróquia, no conselho para os assuntos econômicos deveriam « auxiliar o pároco na administração dos bens da paróquia » tão-somente aqueles fiéis que são expertos na matéria.
bb) Postas as distinções, que relações se pode pensar que haja entre os dois conselhos paroquiais?
De fato a questão foi posta por um Padre da Comissão Pontifícia antes da Plenária de 1981: « É o¬portuno prever alguma conexão ou relação entre o conselho pastoral e o conselho para os assuntos econômicos? Re¬sposta: não se deve prever nenhuma conexão, porque se trata de órgãos diversos » .
Embora esta resposta seja radicalmente negativa, podemos no entanto indicar duas conexões entre os dois conselhos paroquiais, sobretudo levando em conta que os Bispos diocesa¬nos devem promulgar normas concretas na sobredita matéria e talvez as nossas observações possam resultar úteis.
A primeira conexão diz respeito à finalidade e portanto à com¬petência dos dois conselhos: se é verdade que o conselho pastoral deve tratar questões concernentes à atividade pastoral, ele também pode tratar de questões econômicas, na medida em que estas têm um aspecto pastoral e por isso tocam a atividade pastoral. Ou melhor: há questões econômicas que podem apresentar ao mesmo tempo dois diferentes aspectos, um de tipo mais pastoral e outro já mais técnico. Por exemplo, se uma paróquia recebe em herança una casa e se deve decidir a que uso destinar o imóvel, a que¬stão da destinação da casa apresenta dois aspectos. Um é mais pastoral: para qual finalidade (para as pessoas anciãs ou para a catequese?); e o outro é sobretudo técnico (com que obras de reestruturação? com que fundos?). Do pri¬meiro aspecto cuidará o conselho pastoral; já do outro tratará o conselho para os assuntos econômicos.
A outra conexão concerne a composição: nada impede que o Bispo diocesano estabeleça que alguns membros do conselho para os assuntos econômicos devam ser tomados dentre os do conselho pastoral, desde que sejam realmente expertos em questões econômicas. Tampouco devemos esquecer que antes do novo Código em várias dioceses os conselhos pastorais trazia já em seu cerne a chamada comissão administrativa, razão pela qual podemos deduzir que a conexão a que se alude acima já existia na praxe.


(*)Palestra proferida em julho de 2011 em LONDRINA - PR, no XXVI ENCONTRO DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE CANONISTAS e XXVIII ENCONTRO DOS SERVIDORES DOS TRIBUNAIS ECLESIÁSTICOS DO BRASIL - por S.Excia.Revma.Dom Francesco Coccopalmerio - Arcebispo Titular de Coeliana e Presidente do Conselho para os Textos Legislativos do Vaticano.

Direito Canônico - CONSELHO PASTORAL DA PARÓQUIA - Dom Francesco Coccopalmerio - Pontifício Conselho para osTextos Legislativos

"O CONSELHO PASTORAL DA PARÓQUIA"(*)
(Cân. 536)

Do conselho pastoral paroquial trata o cân. 536, que estabelece:
« § 1. Se, a juízo do Bispo diocesano, ouvido o conselho presbiteral, for oportuno, constitua-se em cada paróquia o conselho pastoral, presidido pelo pároco, e no qual os fiéis, juntamente com aqueles que por força do ofício participam no cuidado pastoral da paróquia, prestem a sua ajuda na promoção da ação pastoral.
§ 2. O conselho pastoral tem apenas voto consultivo, e rege-se pelas normas estabelecidas pelo Bispo diocesano » (cân. 536) .

Do texto citado podem inferir-se seis questões: o tipo de obrigatoriedade do conselho pastoral paroquial (par. 9.1); a composição (par. 9.2); a finalidade, o âmbito e a importância (par. 9.3); a posição do pároco (par. 9.4); a natureza da « consultividade » do conselho pastoral paroquial (par. 9.5); as normas do Bispo diocesano para os conselhos pastorais paroquiais (par. 9.6).

9.1 O tipo de obrigatoriedade do conselho pastoral paroquial

a) As palavras supracitadas: « se [...] for oportuno [...] » (cân. 536, § 1) indicam claramente que este conselho não é obrigatório por norma do Código.

Na verdade, o legislador pressupõe que nas diversas Igrejas particulares haja situações diferenciadas nas quais pode ser oportuno ou não oportuno o conselho pastoral paroquial.
A oportunidade ou não oportunidade depende de alguns elementos, entre os quais podemos indicar: a utilidade efetiva (por ex., se os conselhos podem realmente beneficiar o pároco, não, evidentemente, em si, mas, por exemplo, em relação ao atual preparo ou despreparo dos fiéis) ou a ausência de perigos (por exemplo, se não se temem dissensões ou dificuldade para os párocos).
Se a oportunidade subsiste ou não deve ser verificado « a juízo do Bispo diocesano, ouvido o conselho presbiteral » (ibidem). O que se compreende claramente.
Se a oportunidade subsiste, então « constitua-se em cada paróquia o conselho pastoral » (ibidem).
Notemos bem: se o Bispo diocesano julga que subsiste a oportunidade, então promulga uma norma com a qual estabelece que o conselho pastoral paroquial é obrigatório na sua diocese para cada paróquia. O conselho pastoral paroquial se torna, então, obrigatório nesta diocese e para cada paróquia não por força da norma do Código, mas em virtude da norma diocesana.

b) Podemos perguntar-nos ademais: se porventura, a juízo do Bispo, for oportuno instituir o conselho, o Bispo tem a obrigação de instituí-lo ou é livre de instituí-lo ou não? O Bispo tem a obrigação, pois a norma reza: « se [...] for oportuno, constitua-se em cada paróquia o conselho pastoral [...] » e a expressão « constitua-se » (constituatur) configura claramente uma obrigação. É diferente de « pode constituir-se ».
Podemos ainda nos perguntar: o Bispo é obrigado a julgar se há ou não a oportunidade de constituir o conselho pastoral ou pode descurar tal ato? O Código não contém tal obrigação de modo expresso, mas a pressupõe. Portanto, dizemos que o Bispo é obrigado a examinar, juntamente com o Conselho presbiteral, se existe a oportunidade em questão.

c) Isto, no entanto, não significa que, verificada a oportunidade e promulgada a norma por parte do Bispo, seja obrigatório que em cada paróquia seja prontamente formado o conselho: pode, de fato, dar-se que se requeiram tempos mais longos, ao menos para algumas paróquias com particulares dificuldades.
Contudo resulta obrigatório que mesmo estas paróquias se empenhem súbito e seriamente a predispor e sobretudo a preparar os fiéis para que sejam habilitados, o mais breve possível, a constituir o conselho pastoral .


9.2 A composição do conselho pastoral paroquial

Reza o Código:
«[...] presidido pelo pároco, e no qual os fiéis, juntamente com aqueles que por força do ofício participam no cuidado pastoral da paróquia, prestem a sua ajuda na promoção da ação pastoral » (cân. 536, § 1).
São, pois, indicados três gêneros de membro: o pároco, aqueles que participam da cura pastoral na paróquia em virtude do próprio ofício, os fiéis . A expressão usada no Código, talvez porque demasiado sintética, acaba por ser bastante obscura, de tal sorte que temos de procurar compreendê-la de modo mais explícito.

a) Quanto ao pároco. As palavras citadas « presidido pelo pároco » afirmam claramente: o pároco é « o presidente ». Mas restam os problemas. De um lado: o que significa ser «presidente»? e doutro: o pároco é um dos membros do conselho ou fica fora? Procuraremos, mais adiante, tentar dar descobrir uma resposta.

b) Quanto àqueles que tomam parte na cura pastoral da paróquia em virtude do próprio ofício. O que significam precisamente as expressões usadas no texto: « por força do ofício participam no cuidado pastoral », « da paróquia »? E, por conseguinte, quais são com precisão as pessoas de que se fala? É importante determinar isto, porque tais pessoas são membros do conselho pelo direito mesmo do Código.
« Participam no cuidado pastoral » é uma expressão muito genérica. Significa, per se, toda atividade a serviço pastoral dos fiéis, da atividade dos catequistas à dos ministros na liturgia ou dos agentes da caridade, e assim por diante. Todos estes sujeitos « tomam parte no cuidado pastoral ».
« Por força do ofício » parece exigir que esta participação na cura pastoral seja conferida mediante um ofício em sentido próprio, a teor dos cânones 145 ss. E assim é. Por este motivo, não é suficiente desempenhar uma tarefa (isto é, um munus), como por exemplo, ao menos atualmente, o do catequista.
« Da paróquia » (in paroecia) significa « no território da Paróquia » ou « a serviço da comunidade paroquial »? No primeiro caso o capelão de uma capelania (por ex. de um hospital) entraria na previsão do Código, no se¬gundo caso não. A mim me parece que a expressão « da paróquia » deva ser interpretada: a serviço da comunidade paroquial.
Isto posto, podemos dar por adquirido: todos aqueles que exercem uma atividade pastoral por força de um ofício propriamente dito e a serviço da comunidade paroquial são membros do conselho pastoral paroquial pelo direito mesmo do Código.
Os vigários paroquiais se incluem indubitavelmente nesta previ¬são. Diria também os reitores de igrejas (cânn. 556-563).
Outros sacerdotes não necessariamente, por exemplo, um sacerdote ancião que reside na paróquia e ajuda na atividade pastoral, ou então um sacerdote que venha à paróquia somente nos dias festivos, não exercem um ofício propriamente dito e portanto não são membros do conselho pastoral paroquial pelo direito mesmo do Código. Podem sê-lo em virtude dos estatutos de cada conselho.

c) Quanto aos outros fiéis. O Código não especifica nada. Portanto, tudo é deixado às leis particulares e aos estatutos de cada conselho.
Evidentemente nada nos impede de recorrer à nor¬ma paralela sobre o conselho pastoral diocesano (cfr. cân. 512), quer quanto à presença de todos os estados eclesiais (cfr. 1), quer quanto ao critério da chamada representatividade (cfr. 2), quera ainda quanto às qualidades dos membros (cfr. 3).
Quanto ao modo di designar tais fiéis tudo è deixado às leis particulares e aos estatutos de cada conselho, co¬me ocorre no caso paralelo do conselho pastora¬l diocesano (cfr. cân. 512, § 1, no fim). Evidentemente são possíveis quer a eleição por parte dos fiéis, quer a nomeação por parte do pároco, quer — melhor — uma e outra juntas .

9.3 A finalidade, o âmbito e a importância do conselho pastoral paroquial

a) A finalidade do conselho pastoral paroquial não resulta imediatamente perspícua apenas a partir do texto do cân. 536 e, portanto, requer um suplemento de reflexão.

aa) Podemos partir destas palavras: « [...] ajudam na promoção das atividades pastorais » (cân. 536, § 1).
As expressões são de todo genéricas e valem de per si em todos os casos de atividade pastoral: também um catequista enquanto explica a doutrina às crianças presta a própria ajuda para a promoção da ação pastoral.
Por este motivo, a finalidade específica do conselho pastoral paroquial não pode ser definida somente a partir das palavras citadas. Deve-se, portanto, recorrer também e sobretudo à constatação de que a ajuda na atividade pastoral é prestada no âmbito de um conselho.
O que acontece em qualquer conselho? Digamos em síntese: os membros avaliam as questões postas em pauta, propõem os próprios pareceres, confrontam-nos e os discutem e, finalmente formam um parecer unitário. Isto ocorre também no conselho pastoral paroquial.

bb) Todavia a nossa questão não estaria ainda definida, se tivéssemos apenas o § 1 do cân. 536. E isto pelo fato de que o conselho, como descrito acima, poderia ser quer consultivo quer deliberativo.
Examinemos pois o § 2: « O conselho pastoral tem apenas voto consultivo [...] ».
Desta estatuição podemos concluir: o conselho pastoral paroquial forma um parecer unitário; porém pelo fato de que o conselho pastoral tem tão-somente voto consultivo, o conselho não é o sujeito decisor; portanto o sujeito decisor não pode ser senão o pároco; por esse motivo a relação entre conselho pastoral e pároco é entre aconselhador e decisor e portanto o conselho pastoral dá conselhos ao pároco (o qual, pois, fica livre de aceitá-los ou não, ou seja, de decidir segundo os conselhos recebidos ou de modo diferente).
Portanto podemos concluir; a finalidade específica do conselho pastoral paroquial consiste precisamente em dar conselhos ao pároco.

b) O âmbito do conselho pastoral paroquial, isto é, o tipo de questões acerca das quais o conselho oferece pareceres ao pároco, é — segundo o Código — muito vasto. Recordemos as palavras citadas: « para a promoção da atividade pastoral [...] ». Portanto se trata de todas as questões que dizem respeito, nos vários aspectos, ao bem pastoral da paróquia .
A seleção e a proposta das questões a serem tratadas no âmbito do conselho dependem do pároco, ou por sua iniciativa ou a pedido de outros, sobretudo dos membros do conselho, segundo as normas do caso.
A oportunidade de submeter uma questão ao conselho depende certamente da importância da mesma. Podemos dizer: nenhuma questão verdadeiramente importante deveria ser subtraída ao exame do conselho pastoral.

c) A importância do conselho pastoral paroquial pode ser deduzida de três fatores principais.
Antes de tudo o conselho é uma estrutura que torna efetiva a atribuição própria dos leigos de aconselhar os sagrados pastores (cfr. cân. 212, § 3).
Em segundo lugar, e falando mais sociologicamente, o conselho dado não por indivíduos mas por um grupo tem em si mesmo maior garantia, pois as questões são avaliadas por um maior número de pessoas, entre as quais, evidentemente, não faltam os expertos em cada uma das matérias, e assim os conselhos são oferecidos de modo mais competente.
Em terceiro lugar, e falando mais teologicamente, o conselho dado por um conjunto de fiéis tem em si um valor especial, pelo motivo que, onde dois ou três atuam de modo conjunto, lá Cristo se torna presente e o Espírito de Cristo é percebido de modo mais seguro.
Enfim e mais profundamente, o conselho pastoral pa¬roquial è a forma concreta em que a paróquia se torna presente, através dos eleitos, na atividade de deliberação, de acordo com quanto se disse em relação à paróquia como sujeito comunitário e à sua ação (cfr. capítulo 2, par. 2.2).


9.4 A posição do pároco no conselho

Agora podemos retomar as perguntas acima enunciadas: 1) o que significa « presidente » do conselho pastoral paroquial? 2) o pároco também conta entre os membros do conselho ou fica fora dele?
a) A primeira pergunta pode ser tratada em termos gerais: o que significa ser « presidente » de um grupo, de um colégio, de um conselho? A resposta vale também para o caso particular do conselho pastoral paroquial.
As atribuições do presidente podem deduzir-se da lei universal (por exemplo, cfr. cânn. 119, n. 2: dirimir a paridade dos votos; 166, § 1: convocar o colégio; 173, § 2 e § 4: assistir à eleição e subscrever a ata; 176: procla¬mar o eleito; 182, § 1: atividade na postulação), da lei particular ou de cada estatuto dos vários conselhos (cfr. cânn. 500, § 1; 514, § 1). É, por exemplo, próprio do presi¬dente: estabelecer as questões a serem tratadas no conselho, convocar os membros, dirigir a discussão, guiar as votações, em certos casos e em determinadas condições, dirimir com o próprio voto a paridade dos sufrágios expressos (cfr. cân. 119, n. 2), cuidar da execução das deliberações do conselho, representar legalmente a pessoa jurídica, e assim por diante .

b) Também a segunda pergunta pode ser tratada primeiramente de modo genérico. Considerar-se-á em seguida o caso particular de alguns conselhos eclesiais, dentre os quais se coloca o conselho pastoral paroquial. Pomo-nos, portanto, a questão: é o presidente um dos membros do conselho ou fica fora?
aa) Diria que o argumento decisivo para uma resposta positiva ou negativa está em ver se o presidente vota. Se vota, está sem dúvida no conselho. Se não vota, não deveria fazer parte dele.
bb) Mas vejamos agora o caso particular de alguns conselhos ecleisais entre os quais se acha o conselho pastoral paroquial.
Com efeito surge imediatamente uma ulterior e determinante questão: o que devemos pensar quando a norma estabelece que o conselho dá conselhos ou, até mesmo, dá o consenso ao próprio presidente? Nestes casos o presidente pode votar? E se não pode votar, é membro do conselho?
A hipótese supra formulada se verifica em vários casos, entre os quais o do conselho pastoral paroquial, que — como se disse — dá conselhos ao pároco.
Para melhor compreender a questão, façamos recurso a alguns conselhos eclesiais, quais são o conselho presbiteral, o colégio dos consultores, o conselho pastoral diocesano, o conselho diocesano para os assuntos econômicos.
Nestes conselhos o Bispo diocesano é presidente (cfr. cânn. 500, § 1; 502, § 2; 514, § 1; 492, § 1). Estes conselhos dão conselhos ao Bispo diocesano ou também, em certos casos, o seu consenso (cfr. cân. 1292, § 1).
Nestes casos específicos o presidente não pode votar, pois isto seria ou de todo inútil ou até mesmo impossível. Façamos um exemplo de tais situações.
No caso do consenso: un conselho è composto di undi¬ci membri (inclusive il presidente); il conselho vota (escluso il presidente); se otto membri danno voto positivo, il voto positivo del presidente è del tutto inutile; se cinque dan¬no voto positivo e cinque negativo, il voto del presidente, che si aggiungesse ai cinque positivi e dirimesse la parità dei suffragi, sarebbe qualcosa di impossibile, perché il pre¬sidente darebbe il consenso a se stesso.
No caso do conselho, temos de argumentar de modo análogo.
Em outras palavras, é claro que , quer no caso do consenso quer no do conselho, se estes são dadops por um conselho ao seu presidente, o conselho dever ser concebido como um sujeito distinto do presidente mesmo, de modo que este último não pode determinar a orientação do conselho e por isso não pode votar .
Então nos perguntamos: se o presidente, ao menos nos casos acima examinados não pode votar, é ainda membro do conselho?
Se nos atemos ao que observado até aqui, teremos de responder que o presidente, justamente pelo fato de que não pode votar, não faz parte do conselho.
Por outro lado, considerando precisamente o fato de que o presidente é presidente e tem o rol de atribuições que elencamos pouco antes, pareceria estranho, ou pelo menos pouco convincente, julgar que o presidente não seja membro do conselho. O presidente, ao fim e ao cabo, governa o conselho e por este motivo parece pouco lógico considerar que não faça parte dele.
Portanto se nota algo de incongruente nesta estrutura. Vejamos pois a reflexão seguinte.

c) Temos de reconhecer que o caso considerado, isto é, dar o conselho ou o consenso ao próprio presidente, é de todo particular.
Podemos então por a questão: não seria mais justificado abandonar o esquema: « [...] os membros do conselho dão conselhos ao presidente e só o presidente delibera » e adotar o outro: « [...] todo o conselho delibera », em outras palavras: « [...] todos os membros deliberam, ainda que o voto do presidente tenha um valor superior » (cfr. cân. 115, § 2), de sorte que, se o voto do presidente não é concor¬de com o da maioria, não há deliberação? Temos um exemplo no Concílio Ecumênico (cfr. cân. 339, § 1).
O esquema « deliberativo », entendido, porém, no sentido eclesial como supra, não seria mais condizente, por ex., por quanto concerne ao conselho pastoral paroquial, às habilitações e à dignidade dos leigos? É porém absolutamente em linha com a estrutura hierárquica da Igreja? Em todo caso, isto introduz no número seguinte (no qual cfr., de modo particular, c, cc).

9.5 A natureza da «consultividade» do conselho pastoral paroquial

Diz o Código:
« O conselho pastoral tem apenas voto consultivo [...]» (cân. 536, § 2) .
« Voto consultivo » significa simplemente que o pároco fica livre de aceitar ou não os conselhos a ele oferecidos.
No entanto é necessário afrontar a seguir algumas questões acerca da natureza desta « consultividade » para evitar confusões enfadonhas ou até erros em doutrina.
Digamos súbito que os termos e os conceitos de deliberativo e de consultivo são derivados do direito civil. São adequados para a estrutura peculiar da Igreja?
Examinemos então tais conceitos, em primeiro lugar no sentido civilístico e em segundo lugar no sentido eclesial.
a) O conceito de voto deliberativo, entendido em sentido civilí¬stico, significa quanto segue. Um conselho tem voto delibe¬rativo na medida em que os seus membros, inclusive o presidente, são « de igual direito » (cfr. cân. 115, § 2), em outras palavras, cada membro tem uma posição hierarquicamente igual à de cada um dos demais, inclusive o chefe ou o presidente. Por tal posição hierarquicamente igual o voto de cada membro, inclusive o do presidente, tem valor igual ao de cada um dos demais. A deliberação de um conselho consiste simplesmente na soma dos votos e na sua maioria, mesmo que entre os votos da maioria nùao conste o do presidente.
Este conceito de voto deliberativo não pode sempre adaptar-se à peculiar estrutura da Igreja. Temos disso um claríssimo exemplo no Concílio Ecumênico. Diz-se que este é deliberante (cfr. cân. 339, § 1). Isto é verdadeiro, não, porém, em sentido civilístico. Efetivamente os membros do Concílio Ecumênico não são « de igual direito », pois a posição do Papa é hierarquicamente superior e, portanto, o voto do Papa tem um valor superior, de sorte que a deliberação do Concílio consiste na soma dos votos e na sua maioria, somente se entre os votos da maioria constar o do Romano Pontífice (cfr. cân. 341, § 1).
b) O conceito de voto consultivo, entendido em sentido civilí¬stico, significa tem o seguinte significado: o sujeito deliberante, antes de proceder à sua deliberação, pede a um outro sujeito, isto é, ao sujeito consulente, « uma iluminação » para tomar uma decisão.
Pergunta fundamentalmente duas coisas: elementos de cognição (como estão as coisas? Como é a realidade?) e/ou um conselho prático (come julga que se deva agir?). De fato, assim acontece, por exemplo, em um juízo penal: o juiz pergunta ao perito como estão as come, como é a realidade (pede, por ex., ao experto balístico se este projétil foi disparado por esta arma) e e pede aos titulares da acusação e da defesa que expressem um conselho sobre como agir, isto é, sobre se condenar ou absolver.
O sujeito deliberante, obtida a resposta, fica livre de aceitá-la o ou não, ou seja, fica livre para deliberar de acordo com aquela resposta ou de deliberar de modo diferente.
Datos estes elementos, é necessário prosseguir a reflexão sobre duas ulteriores questões: o pedido de conselhos e a aceitação deles.
aa) O pedido de conselhos:
O motivo pelo qual um sujeito deliberante pede conselhos a um outro sujeito é precisamente: de um lado, porque o sujeito consulente è experto, isto é, conhece as coisas e julga retamente sobre a questão; doutro lado, porque o sujeito deliberante não conhece as coisas e/ou tem incertezas no seu juízo. O motivo, portanto, do pedido dos conselhos é —digamos — de natureza « humano-sociológica » (com esta espressão queremos indicar o modo normal de relação deliberante-consulente, ou seja, como tal relação ocorre na comunidade humana, à diferença de quanto ocorre — di-lo-emos mais adiante — na comunidade eclesial).
A obrigação de pedir conselhos existe — como clara conseqüência — na medida em que existe a ignorância (no deliberante)-conhecimento (no experto), de que falamos antes. Não existe, pelo contrario, na medida em que não existe ignorância no sujeito deliberante: pode efetivamente ser inútil, e por isso mesmo não obrigatório, pedir elementos de cognição e/ou um conselho prático, se o sujeito deliberante conhecer já suficientemente o estado das coisas ou se já formou sobre a questão um juízo prático seguro. A menos que uma específica norma estabeleça tal obrigatoriedade. Portanto o sujeito deliberante não só é livre na aceitação ou não do conselho oferecido pelo experto (cfr. infra), mas é igualmente livre no próprio pedido do conselho (a menos — repito — que uma especifica norma estabeleça tal obrigatoriedade).
bb) A aceitação dos conselhos. Como já disse, o sujeito deliberante pode aceitar e pode não aceitar a resposta oferecida pelo experto.
A eventual não aceitação pode dizer referir-se a ambos os objetos acima indicados: elementos de cognição e juízo prático. Parece, porém, que a eventual não aceitação diga mais respeito ao juízo prático do que aos elementos de cognição, posto que no primeiro caso parece haver um âmbito maior de discricionariedade.
Ora perguntemo-nos: por que o sujeito deliberante não aceita os conselhos oferecidos pelo experto?
O motivo parece, ao fim e ao cabo, ser este: o sujeito deliberante está convencido — não de modo voluntarístico, mas por motivos fundados — de que o seu pensamento seja mais válido do que o do experto. E também aqui podemos dizer que este motivo é de natureza humano-sociológica (isto é, a maior validade do pensamento do deliberante contra a menor validade do pensamento do experto).
c) Ilustrada a natureza do « consultivo » civilístico, podemos passar a considerar a do « consultivo » eclesial.
Para compreender a questão, temos de sublinhar um pressuposto: os fiéis têm a habilitação e, portanto, a obrigação e o direito, de aconselhar os sagrados pastores precisamente pelo fato de que são fiéis (cfr. cân. 212, § 3), ou seja, são batizados e crismados, em outras palavras são conselheiros dos sagrados pastores em razão dos sacramentos do batismo e da confirmação.
Posta esta premissa, afrontemos a questão do « consultivo » eclesial, falando distintamente — como supra acerca do consultivo civilístico — da solicitação de conselhos e da sua aceitação.
aa) A solicitação dos conselhos:
O motivo pelo qual os sagrados pastores pedem conselhos aos fiéis é, na realidade, dúplice:
— porque os fiéis são capazes de aconselhar quer genericamente quer especificamente em certas matérias nas quais são particularmente versados (cfr. a este propósito, as palavras introdutórias do cân. 212, § 3: « De modo proporcionado à ciência, à competência e ao prestígio de que gozam [...] ») e os sagrados pastores têm necessidade de ser ilustrados qeur em geral quer especificamente em certas matérias e / ou podem ter incertezas no juízo. Este motivo é, ainda, como no consultivo civilístico, de natureza « humano-sociológica »;
— porque os fiéis são conselheiros dos sagrados pastores em razão dos sacramentos do batismo e da confirmação. Este motivo já não é de natureza « humano-sociologica », mas sim de natureza claramente « teológica ».
A obrigação de pedir conselhos é também dúplice:
— existe na medida em que existe aquele conhecimento/ignorância de que falamos mais de uma vez (motivo de natureza sociológica);
— mas mesmo que não exista a sobredita situação sociológica, a obrigação de solicitar conselhos existe ainda e integralmente, pelo fato de que existe, ainda e integralmente o motivo de natureza teológica: ainda que os sagrados pastores, no momento da operar uma deliberação, conheçam perfeitamente o estado das coisas e tenham já em si um juízo sobre como agir de que se sentem seguros, ainda, pois, que se haja todos os pressupostos para operar uma deliberação que seja boa, sem embargo, os sagrados pastores têm a obrigação de pedir conselhos aos fiéis (ao menos — evidentemente — nas questões importantes e em via normal), precisamente pelo motivo de natureza teológica, ou seja, pelo fato de que os fiéis são conselheiros dos sacrados pastores por força dos sacramentos do batismo e da confirmação. Do contrário, os sagrados pastores não reconheceriam as atribuições conferidas aos fiéis pelos próprios sacramentos.
E, se por ventura os fiéis não gozam de ciência, competência e prestígio, devem ser formados para adquirirem estas qualidades.
Podemos facilmente compreender como a diferença essencial entre o consultivo civilístico e o eclesial se encontrem no que disse acima.
Podemos acrescentar uma observação recorrendo a uma analogia fácil. Os fiéis têm, por causa do batismo, a habilitação, a obrigação e o direito de participar na celebração da Eucaristia. O pároco poderia celebrar a Eucaristia mesmo sozinho e tal celebração seria válida (cfr. cân. 904). No entanto ele tem a obrigação de convidar a todos os fiéis a particicipar com ele na Eucaristia. Do contrário, comportar-se-ia contra a habilitação conferida aos fiéis pelos próprios sacramentos.

bb) A aceitação dos conselhos
É bom reiterar que os sagrados pastores ficam livres de aceitar ou não os conselhos oferecidos pelos fiéis.
No entanto, nos perguntamos: a não aceitação dos conselhos dos fiéis pode ocorrer pelo mesmo motivo que identificamos no consultivo civilístico? O motivo do con¬sultivo civilístico — como se disse acima — consiste funda¬mentalmente no fato de que o sujeito deliberante considera que o seu juízo seja melhor do que o do experto. Trata-se de um motivo humano-sociológico.
Afirmamos que isto não é suficiente no consultivo eclesial, pois o motivo para não aceitar os conselhos oferecidos pelos fiéis deve ser adequado a esta peculiar situação.
Em que consiste esta adequação? Julgamos que o motivo adequado para não acolher os conselhos seja somente este: o pastor julga em consciência, ou seja, diante de Deus, di não poder aceitar os conselhos; em outras palavras, o pastore sente que os conselhos oferecidos constituem algo de nega¬tivo, de não justo, e isto diante de Deus; em outras palavras ainda, o pastore conclui que, se o Senhor expressasse o seu pensamento, este seria de não aprovação de quanto proposto pelos fiéis.
Não é, com efeito, suficiente, como no consultivo civilísti¬co, que o pastore considere que o seu juízo seja melhor do que o dos fiéis. O pastor, na verdade, deve ter um outro juízo que ele, na sua consciência, repute ser justo diante de Deus, que ele, na sua consciência, considere, o juízo de Deus. O motivo é, portanto, não de natureza sociológica, mas de natureza teológica. Por outro lado, não somente no caso em questão, mas em toda a nossa conduta, nós devemos procurar não a nossa vontade, mas a vontade de Deus.
Em tudo o que até aqui foi dito, podemos divisar a diferença essencial entre o consultivo civilístico e o consultivo eclesial.
Presume-se que o discurso que estamos fazendo vale para as questões de grande importância para a vida da Igreja, não necessariamente para as de menor importância ou as corriqueiras.
Leve-se em conta, em todo caso, uma ulterior observação: no caso em que os sagrados pastores não estejam de acordo com os conselhos oferecidos, podem sempre, se a decisão não é urgente, adiar a questão para um tempo sucessivo, propondo que a questão seja avaliada de novo e considerada de modo mais maduro, de sorte que seja possível, provavelmente em um futuro próximo, encontrar uma visão mais comum e mais profunda . O que dissemos parece coerente com a indicação do Código, lucidamente expressa nas Normas gerais: « [...] o Superior, embora não tenha obrigação de seguir o parecer delas (= di singole per¬sone), mesmo sendo concorde, contudo, sem razão prevalente, que ele mesmo avaliará, não se afaste do parecer delas, sobretudo se foi concorde » (cân. 127, § 2, n. 2) .
cc) O consultivo eclesial (não dissimilmente do con¬sultivo em geral) pressupõe a distinção entre dois sujeitos, o que oferece conselhos (os fiéis) e o que opera a deliberação (o pastor). Esta concepção é absolutamente correta e legítima.
Todavia nos perguntamos: não seria possível progredir ulteriormente, como já acenávamos acima (cfr. par. 9.4, c), para chegar a uma visão mais profunda e de mais fácil compreensão?
Uma possível solução seria a seguinte: não subsistiria distinção entre sujeito que oferece conselho e sujeito que opera a deliberação, pelo fato de que haveria um só sujeito, o deliberante, e tal sujeito deliberante seria o conjunto do pastor e dos fiéis, ou seja, o conjunto composto por pastores e fiéis; todavia, o pastor, nesse conjunto deveria sempre considerar-se como hierarquicamente superior, tendo o voto do pastor um valor hierarquicamente superior, no sentido já anteriormente precisado, sendo a deliberação o conjunto que consiste na maioria dos votos entre os quais está o voto do pastor. Em outras palavras, se a maioria dos votos é a favro de uma certa deliberação e o voto do pastor a assume, ou seja, é concorde com ela, temos uma deliberação do conjunto; se, porém, embora a maioria dos votos esteja a favor de uma certa deliberação, todavia o voto do pastor não concorda com ela, então não temos uma deliberação do conjunto.
Como é evidente, esta estrutura pode ser denominada « deliberativo eclesial » e é de todo semelhante à que acima dizíamos ser própria do Concílio Ecumênico.
Esta visão é preferível? Parece-me que se deva responder afirmativamente. Com efeito: de um lado, não tira nada da posição do pastor, cujo voto resta determinante; por oltro lado, sublinha ao máximo que a decisão deriva de todos os membros da comunidade, isto é, do sujeito unitário agente que é precisamente a paróquia (como se viu no capítulo 2, par. 2.2).


9.6 As normas do Bispo diocesano para os conselhos pastorais paroquiais

Eis as palavras do Código:
« O conselho pastoral [...]rege-se pelas normas estabelecidas pelo Bispo diocesano » (cân. 536, § 2) .
É necessário que o Bispo diocesano estabeleça estas normas.
Quanto ao conteúdo podemos fazer as seguintes considerações:
a) Antes de tudo será importante, ainda que sinteticamente, retomar alguns princípios doutrinais, sobretudo no que tange à estrutura e atividade da paróquia, à tarefa dos leigos nela, à relação entre leigos e pároco, à natureza e a função do conselho pastoral, e assim por diante.
b) Uma outra parte das normas poderá ser reservada à composição do conselho pastoral. Além do pároco, em qualidade de presidente e dos outros membros de direito ex Co¬dice (cfr. sopra, par. 9.2, b), pertencem ao conselho os fiéis leigos. As normas deverão especificar: o número dos membros leigos (por ex.: tantos para as paróquias com um tantos habitantes, e depois aumentando proporcionalmente o número para as paróquias maiores); os requisitos essenciais de participação (por ex.: a idade mínima, a pertença à paróquia, as qualidades espirituais); o modo de designação (por ex.: 2/3 por eleição da comunidade, 1/3 por designação do pároco); os que têm direito a voto ativo (por ex.: quem completou o 18º ano de idade), e assim por diante.
c) Será oportuno indicar a duração do conselho (por ex.: um qüinqüênio); os motivos e o modo de proceder para a renúncia e a exlcusão, o modo de proceder para a substituição dos membros renunciatários ou excluídos.
d) Será útil determinar claramente o modo de proceder para a formação do sonselho. Normalmente o trabalho será confiado a uma comissão preparatória. A esta competirá: sensibilizar a comunidade paroquial sobre a importância do conselho e da sua correta formação; compor a lista dos candidatos; preparar e dirigir a votação; verificar os votos; proclamar os eleitos e assim por diante.
e) As normas, enfim, deverão precisar quais são as atividades do conselho e os modos de proceder nas suas sessões. Será, por ex., oportuno indicar: os moderadores, a secreta¬ria, as comissões, os peritos; a freqüência das sessões; o modo de convocação; a formação da pauta; o modo como se desenrolam as sessões; os requisitos da votação; a publicação das conclusões, e assim por diante.
f) Será também oportuno que as normas prevejam a obrigação de que cada conselho se dê regulamentos, nos quais as normas do Bispo diocesano sejam adaptadas mais analiticamente às circunstâncias concretas de cada paróquia .
g) Queremos acrescentar três possibilidades.
aa) A primeira: se, por um lado, há a obrigação de ouvir o conselho presbiteral sobre a constituição ou não do conselho pastoral paroquial, por outro lado não ficou estatuído obrigação alguma de ouvir o conselho presbiteral sobre as normas de que estamos falando. Isto, contudo, poderá ser útil, não só para estabelecer de modo mais correto as próprias normas, mas também para tornar mais fácil a aceitação por parte do presbitério da existência dos conselhos pastorais e da obrigatoriedade da sua constituição.
bb) A segunda possibilidade: é de se favorecer uma conexão entre o conselho pastoral e o conselho para os assuntos econômicos (cân. 537). Por exemplo: o Bispo diocesano poderia, juntamente com as normas sobre o conselho pastoral, estabelecer também as normas sobre o conselho para os assuntos econômicos e emití-las juntas, pelo menos pela vantagem da facilidade de consultação.
cc) A terceira possibilidade: a Conferência episcopal ou a Reunião dos Bispos de uma provincia eclesiástica poderia utilmente tornar homogêneos os estatutos dos conselhos das várias dioceses. Isto não implica de modo algum uma uniformidade para todas as dioceses, mas, precisamente, apenas homogeneidade, ao menos nos critérios .
h) Uma última sugestão: o Bispo diocesano poderia estabelecer que todos os conselhos pastorais paroquiais cessassem e se renovassem na mesma data, de sorte que tal dia tenha uma particular solenidade e dê relevo aos conselhos mesmos. Pode-se afirmar igualmente a propósito dos conselhos para os assuntos econômicos.

(*)Palestra proferida em julho de 2011 em LONDRINA - PR, no XXVI ENCONTRO DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE CANONISTAS e XXVIII ENCONTRO DOS SERVIDORES DOS TRIBUNAIS ECLESIÁSTICOS DO BRASIL - por S.Excia.Revma.Dom Francesco Coccopalmerio - Arcebispo Titular de Coeliana e Presidente do Conselho para os Textos Legislativos do Vaticano.

Direito Canônico - Dom Francesco Coccopalmerio - Pontifício Conselho para os Textos Legislativos

"O PONTIFÍCIO CONSELHO PARA OS TEXTOS LEGISLATIVOS"(*)

INTRODUÇÃO

A Constituição Apostólica Pastor Bonus, de 28 de junho de 1988, com a qual o Sumo Pontífice João Paulo II houve por bem continuar a delicada obra de reestruturação da Cúria Romana, contém na introdução alguns textos significativos para nós. Dentre eles citamos o seguinte: « [...] o Concílio afirma com estas palavras: “No exercício do poder supremo, pleno e imediato sobre a Igreja Universal, o Romano Pontífice serve-se dos Dicastério s da Cúria Romana, que, por isso, trabalham em seu nome e com a sua autoridade, para bem das Igrejas e em serviço dos sagrados pastores” (Christus Dominus, 9). [...] De tudo isto resulta claramente que a característica principal de todos e de cada um dos Dicastério s da Cúria Romana é a ministerial, como afirmam as palavras já citadas do Decreto Christus Dominus, e sobretudo a expressão: “O Romano Pontífice serve-se dos Dicastério s da Cúria Romana” (ibid.). Indica-se assim, de um modo evidente, a índole instrumental da Cúria, descrita num certo sentido como um instrumento nas mãos do Papa, de maneira que ela não tem autoridade alguma nem poder algum além dos que recebe do Supremo Pastor » (Pastor Bonus, Introdução, n. 7).

1. Partindo da autorizada indicação do texto apenas citado, podemos nos deixar guiar por um pressuposto teorético-prático absolutamente claro e seguro: a Cúria Romana existe para ajudar o Romano Pontífice a cumprir de modo otimizado as suas multíplices atividades ao serviço da Igreja Universal; a Cúria Romana não é autônoma, não tem atividades próprias, mas é relativa ao Papa, tem as atividades do Papa, ajuda o Papa a levá-las a cabo.
A partir desse pressuposto se colhe ao mesmo tempo e muito logicamente a estruturação de fundo da Cúria Romana: efetivamente o Romano Pontífice desenvolve muitas atividades ao serviço da Igreja Universal e a Cúria Romana ajuda o Papa a desempenhá-las de modo otimizado; se agora identificamos e elencamos essas atividades do Papa e confiamos cada uma delas a vários sujeitos ou estruturas, temos imediata e logicamente uma série de organismos de Cúria, cada um dos quais tem a titularidade de uma das atividades do Papa, para desempenhá-la em auxílio ao Papa. Nascem assim as Congregações, os Conselhos Pontifícios, os Tribunais, os Ofícios e outros Organismos.
Cada Dicastério tem uma competência e esta competência consiste precisamente numa atividade do Papa (às vezes uma principal e Outras secundárias ou acessórias) a desempenhar em ajuda ao Papa.
Assim, apenas para exemplificar e reafirmar o conceito, a Congregação para a Doutrina da Fé vigia, em ajuda ao Papa, sobre a correção da fé católica, atividade esta evidentemente própria do Pastor supremo; ou o Pontifício Conselho para a Promoção da Unidade dos Cristãos se esforça, em auxílio ao Papa, para que se alcance a plena reunião entre as Igrejas, outra obra do Pastor Supremo, e assim por diante.

2. O Pontifício Conselho para os Textos Legislativos, que competências tem, que atividades desenvolve em ajuda ao Romano Pontífice?
As competências e as atividades do Pontifício Conselho estão indicadas na Constituição Apostólica Pastor Bonus, artt. 155-158.
Contudo, temos de sublinhar que no período de quase vinte anos transcorrido após a Pastor Bonus, o Pontifício Conselho desenvolveu uma praxe multíplice e isto levou, de um lado, a precisar as sobreditas competências e, de outro, a identificar algumas novas.
A este propósito pode resultar muito instrutivo elencar as mudanças que se verificaram na denominação do Dicastério: e, com efeito, o Pontifício Conselho denominava-se inicialmente (1984) Pontifícia Comissão para a Interpretação Autêntica do Código de Direito Canônico, em um segundo momento (1988) passou a se chamar Pontifício Conselho para a Interpretação dos Textos Legislativos e atualmente (2000), de modo mais genérico, Pontifício Conselho para os Textos Legislativos. Estas mudanças de denominação podem resultar – como dizíamos – muito instrutivas, porque revelam uma progressiva mudança nas competências e nas atividades do Dicastério. E isto como conseqüência das variações surgidas no ordenamento canônico e do rápido desabrochar de novas exigências.

3. Como podemos hoje expressar de modo satisfatório as competências e as atividades do Pontifício Conselho? Tendo e, conta a compreensão adquirida e seguindo o princípio hermenêutico da ajuda da Cúria ao Papa, podemos partir das atividades do Romano Pontífice em relação ao direito da Igreja, para melhor definir também as competências do Pontifício Conselho para os Textos Legislativos.
Parece, pois, que se possam indicar os seguintes capítulos de atividades do Romano Pontífice em relação ao direito da Igreja: I) atividade de legislação; II) atividade de vigilância; III) atividade de interpretação; IV) atividade de promoção do conhecimento e da aplicação do direito canônico.
O Pontifício Conselho para os Textos Legislativos ajuda o Papa no cumprimento otimizado de tais atividades.

I
AJUDA AO PAPA NA ATIVIDADE DE LEGISLAÇÃO

Um primo, grande capítulo das atividades do Romano Pontífice em relação ao direito eclesial é a atividade de legislação. E esta atividade é para o Papa uma das tarefas mais importantes e também das mais relevantes do ponto de vista pastoral.
A atividade de legislação se exerce normalmente em dois casos: no caso da “lacuna iuris” e no da obsolescência da norma. No caso da “lacuna iuris”, é preciso que a carência normativa seja solicitamente preenchida e daí decorre a necessidade de estatuir uma norma nova. No caso de obsolescência da norma, em que tal norma tenha se tornado nociva ou simplesmente inútil, é preciso que a situação negativa seja rapidamente resolvida e portanto torna-se necessário modificar a norma, corrigindo-a ou substituindo-a.
O Pontifício Conselho para os Textos Legislativos ajuda o Papa nos casos supramencionados com dois serviços: a) a monitoração constante das normas canônicas com a identificação de situações de lacuna ou de obsolescência, a comunicação destas lacunas ao Papa, com a conseqüente proposta de estatuição ou de modificações; b) a redação e a apresentação de um texto ao Papa.

1. Monitoração das normas com identificação de carências, a assinalação ao Papa e a proposta de intervenções

Esta competência não está contida na Pastor Bonus, mas foi confiada ao Pontifício Conselho pelo Secretário de Estado. Mas de fato, esta sempre esteve presente na atividade do Dicastério, que compôs o Código.

1.1. O Pontifício Conselho para os Textos Legislativos deve atuar uma monitoração constante das normas canônicas, em toda a sua extensão.
Esta monitoração contínua e geral tem evidentemente o fim de verificar se a normativa canônica é homogênea, completa e atualizada.
Fica bem evidente que tal exame pode ser atuado com eficácia pelo Pontifício Conselho para os Textos Legislativos, enquanto organismo competente e unitário.
Decorre, pois, com clareza a importância, ou melhor, a necessidade do serviço descrito supra.

1.2. O exame constante das normas permite ao Pontifício Conselho identificar “lacunae iuris” ou obsolescências da norma. Nestes casos o Dicastério providenciará que se faça um cuidadoso estudo dos casos individuados e que necessitam de intervenção.

1.3. Individuado e oportunamente precisado o ponto que precisa de intervenção, o Pontifício Conselho para os Textos Legislativos notifica ao Papa o caso em questão juntamente com a necessidade de intervir para preencher a carência ou para resolver a obsolescência da norma em questão.

2. Redação de um texto e apresentação ao Papa

Caso o Papa se declare favorável a uma integração normativa ou uma renovação da mesma, o Pontifício Conselho para os Textos Legislativos redige um texto normativo e o apresenta ao Papa, Legislador supremo.
2.1. Para evitar qualquer equívoco, podemos súbito salientar que quando o Pontifício Conselho redige um texto normativo não estatui norma alguma, mas prepara somente um esquema. O Pontifício Conselho não é legislador. Unicamente o Papa é legislador. Precisamente por este motivo o Pontifício Conselho se limita a preparar um esquema e a apresentá-lo Papa. O Papa então decide se acolher ou não o esquema normativo proposto.
2.2. Esclarecido este ponto, devemos ao mesmo tempo reconhecer que a atividade de redação de um texto normativo por parte do Pontifício Conselho oferece um resultado particularmente qualificado. E isto pela óbvia razão da competência científica e técnica, institucionalmente específica do Dicastério in questão e não necessariamente própria de outros organismos da Cúria.
2.3. Na redação de um texto normativo o Dicastério para os Textos Legislativos não procede de modo independente, mas entra utilmente em contacto com o Dicastério competente na matéria determinada, objeto da norma em fase de redação. Isto permite individuar melhor as necessidades a tomar em consideração e a traduzir no texto normativo.
2.4. Apraz-nos recordar e sublinhar, precisamente no XXVº aniversário da promulgação e da entrada em vigor do Código de Direito Canônico, que esta obra, fruto de longos anos de trabalho técnico-legislativo, nasceu da Pontifícia Comissão para a Revisão do Código de Direito Canônico, organismo que se transformou, em 1988, no atual Pontifício Conselho para os Textos Legislativos.

II
AJUDA AO PAPA NA ATIVIDADE DE VIGILÂNCIA E, PORTANTO, DE GARANTIA DA CORRETTA APLICAÇÃO DO DIREITO ECLESIAL

Um segundo, grande capítulo das atividades do Romano Pontífice em relação ao direito eclesial é a atividade de vigilância e, portanto, de garantia da correta aplicação do mesmo direito .
A atividade de vigilância e de conseqüente garantia se exerce normalmente em dois âmbitos: um mais específico da atividade de produção normativa dos Dicastérios da Cúria ou dos episcopados e outro mais amplo da praxe concreta dos Pastores e dos fiéis.
O Pontifício Conselho para os Textos Legislativos presta ao Papa a própria ajuda nos mencionados âmbitos com quatro serviços: a) exame dos textos normativos produzidos pelos Dicastérios da Cúria; b) exame dos decretos gerais produzidos pelas Conferências episcopais; c) eventual exame das leis particulares e dos decretos gerais emitidos vários legiladores inferiores à Autoridade suprema; d) individuação e notificação da Autoridade competente de eventuais casos de não aplicação das normas vigentes ou de praxe contrária às mesmas normas.

1. Exame dos textos normativos produzidos pelos Dicastérios da Cúria

Cada Dicastério da Cúria Romana pode desempenhar a função de monitorar as normas canônicas e de propor integrações ou modificações no âmbito da própria competência. E, com efeito, cada Dicastério tem competência em uma matéria determinada e portanto conhece direta e profundamente tal matéria. Por isso pode identificar com maior facilidade eventuais “lacunae iuris” ou obsolescências da norma na matéria particular de sua específica competência. E, pelo mesmo motivo, tem maior capacidade de delinear soluções idôneas.
Daí decorre que a redação de um texto normativo pode ser feita por um outro Dicastério da Cúria Romana, se se tratar de matéria que seja de sua pertinência.
Mesmo no sobredito caso, deve porém intervir a assistência jurídica do Pontifício Conselho para os Textos Legislativos. Isto é previsto pela Pastor Bonus e pelo Regulamento Geral da Cúria Romana. A Pastor Bonus assim reza: “Hoc Consilium ceteris Romanis Dicasteriis præsto est ad illa iuvanda eo proposito ut decreta generalia exsecutoria et instructiones ab iisdem edendæ iuris vigentis præscriptis congruant et recta forma iuridica exarentur” (art. 156). No mesmo sentido o Regulamento Geral da Cúria Romana, que assim estabelece: “I documenti dei Dicasteri destinati alla pubblicazione... se hanno natura di decreti generali esecutivi o di istruzioni, devono essere inviati, per un esame circa la loro congruenza legislativa con il diritto vigente e la loro corretta forma giuridica, al Pontificio o Pontificio Consiglio per i Testi Legislativi” (art. 131, § 5).
Para compreender corretamente os textos citados é necessário proceder per etapas.
1.1. Na redação das normas dos Dicastérios da Cúria devem distinguir-se e manter-se distintos, três elementos: a) o objeto da norma; b) a correção doutrinal; c) a congruência com o direito vigente e a correta forma jurídica. O objeto da norma é escolhido pelo Dicastério que propõe a norma mesma; a correção doutrinal é controlada e certificada pela Congregação para a Doutrina da Fé; a congruência com o direito vigente e a correta forma jurídica são garantidas pelo Pontifício Conselho para os Textos Legislativos.
A congruência com o direito vigente significa que o texto em exame não contrasta com tal direito e se insere no conjunto de modo harmônico. A correta forma jurídica significa que o texto em exame se expressa em fórmulas juridicamente exatas e ao mesmo tempo facilmente inteligíveis.

1.2. Posta esta premissa, parece que a atividade do Pontifício Conselho de dar assistência aos Dicastérios da Cúria na redação dos textos normativos, possa dar-se de três modos:
a) um Dicastério da Cúria Romana predispõe um texto normativo e o submete ao exame do Pontifício Conselho
b) um Dicastério da Cúria Romana pede ao Pontifício Conselho predispor um texto normativo
c) um Dicastério da Cúria Romana e o Pontifício Conselho procedem de modo conjunto para chegar à redação de um texto normativo.
Na hipótese a) o Pontifício Conselho julga não o objeto da norma, não a correção doutrinal, mas os dois requisitos indicados pouco antes: a congruência com o direito vigente e a correta forma jurídica.
Na hipótese b) o Pontifício Conselho recebe do Dicastério interessado o objeto a tratar e cuida da redação do texto normativo.
Na hipótese c) o Dicastério interessado e o Pontifício Conselho formam uma comis¬são mista e procedem assim conjuntamente. A Comissão mista pode ter sede e desenvolver os trabalhos num ou noutro Dicastério.
As três preditas hipóteses são todas legítimas. No entanto há motivos que aconselham a evitar a primeira hipótese e, portanto, a considerar oportuno que se contate desde o início o Pontifício Conselho para os Textos Legislativos para proceder num trabalho conjunto.

1.3. Revela-se fácil formular a “ratio” da competência em questão: pressupondo que os documentos normativos devam ser redigidos em congruência com o direito vigente e na correta forma jurídica, decorre de modo bem evidente que o próprio autor dos documentos tem o dever, e o interesse, de consultar o sujeito competente para lhe assegurar este dúplice requisito.
Por esta razão, é espontâneo perguntar por que a Pastor Bonus (art. 156) e o Regulamento Geral da Cúria Romana (art. 131, § 5) mencionam tão-somente “os decretos gerais executivos e as instruções” e sem qualquer referência a outros textos normativos, dentre os quais, sobretudo as leis, como por exemplo, as “Normae speciales”. Pode-se obter uma provável resposta considerando que a Pastor Bonus e o Regulamento Geral se referem espontaneamente apenas aos textos que os Dicastérios da Cúria Romana costumam produzir na maioria dos casos as mais das vezes: neste caso os citam a título exemplificativo, sem por isso excluir outros tipos.
E, com efeito, se porventura um Dicastério viesse a produzir um documento diferente dos anteriormente citados, ficaria igualmente obrigado a submeter tal texto ao exame prévio por parte do Pontifício Conselho para os Textos Legislativos. E isto pelo motivo – que se pode facilmente intuir – de que também neste caso subsistiria a “ratio” da mencionada obrigação e que, portanto, ficam garantidas a congruência com o direito vigente e a correta forma jurídica. Por isso, se se tratasse, como no caso das “Normae speciales”, de textos normativos de natureza legislativa e, portanto, de nível superior aos de natureza executiva, a necessidade de garantir a congruência e a correção de que falamos antes subsistiria com maior intensidade e a obrigação de submeter a um exame prévio teria conseqüentemente uma força vinculante maior.
Se é plausível o que se disse, podemos então acrescentar razoavelmente que o Pontifício Conselho para os Textos Legislativos está à disposição do Papa precisamente para oferecer-lhe uma assistência sobre os dois elementos repetidamente evocados, no momento em que ele queria redigir um texto normativo e julgue útil pedir ao Dicastério uma assistência jurídica.

2. Exame dos decretos gerais produzidos pelas Conferências episcopais

Competência prevista pela Pastor Bonus, que così recita: “Eidem insuper subicienda sunt a Dicasterio competenti pro recognitione decreta generalia Episcoporum cœtuum ut examinentur ratione habita iuridica” (art. 157).
2.1. O texto fala dos decretos gerais das Conferências episcopais, ou seja, dos decretos gerais previstos pelo cân. 455, especificamente para o caso das Conferências episcopais.
Dentre os supramencionados decretos gerais assumem uma particular importância os estatutos das Conferências episcopais.
Estes decretos gerais são submetidos ao exame do Pontifício Conselho para os Textos Legislativos pelo Dicastério competente para a concessão da “recognitio” prescrita pelo cân. 455, § 2 (Congregação para os Bispos, para as Igrejas Orientais, para a Evangelização dos Povos), Dicastério este que pede o parecer prévio do Pontifício Conselho a fim de conceder a “recognitio”.

2.2. O que examina o Pontifício Conselho nos decretos gerais que os são submetidos? O artigo em questão diz somente: “decreta generalia... examinentur ratão habita iuridica”. Expressão de todo vaga. Porém, deve-se considerar fundadamente que o Pontifício Conselho é chamado a examinar o texto e a expressar um juízo sobre a congruência com o direito vigente e sobre a correta forma jurídica. Assim julgamos poder afirmar, confrontando por analogia o art. 157 com o art. 156: “iuris vigentis praescriptis congruant” e “recta forma iuridica exarentur”.

2.3. A “ratio” do pedido ao Pontifício Conselho que dê um parecer prévio mostra-se clara em si, e é dúplice: por um lado, a necessidade que os decretos gerais produzidos pelas Conferências episcopais tenham os conhecidos requisitos da congruidade com o direito vigente e da correta forma jurídica e, por outro, o recurso ao sujeito institucionalmente competente para assegurar a presença no texto do citado dúplice requisito.
Lembremos que os decretos gerais “são propriamente leis” (cân. 29-30). Eis porque os decretos gerais, a que se refere o citado cân. 455, são para uma Conferência episcopal o tipo de norma mais ponderosa. Daqui se compreende que se peça a “recognitio” à Santa Sé a importância do parecer prévio do Dicastério para os Textos Legislativos.
Podemos ainda notar que a competência para examinar e julgar a atuação dos legisladores inferiores faz parte do exercício do primado do Papa, que se estende – como bem sabemos – a todas e a cada uma das Igrejas particulares.

3. Eventual exame das leis particulares e dos decretos gerais emitidos pelos vários legisladores inferiores à Autoridade suprema

Também a sobredita competência está contida explicitamente na Pastor Bonus, que assim determina: “Iis quorum interest postulantibus, decernit utrum leges particulares et generalia decreta, a legislatoribus infra supremam auctoritatem lata, universalibus Ecclesiæ legibus consentanea sint necne” (art. 158).

3.1. O texto fala das leis particulares (cf. cân. 7-22) e dos decretos gerais (cf. cân. 29-33) produzidos pelos vários os legisladores inferiores à Autoridade suprema, ou seja, pelso Bispos diocesanos (cf. cân. 391) bem como pelos Concílios particulares (cf. cân. 445).
Estes textos são submetidos ao Pontifício Conselho para os Textos Legislativos por iniciativa daqueles que têm interesse em obter um exame e um conseqüente juízo.

3.2. O Pontifício Conselho julga (“decernit”) se as normas em questão são conformes (“consentanea”) às leis universais da Igreja (“universalibus Ecclesiae legibus”). Em Outras palavras, julga se as normas em questão têm o requisito da congruência com o direito vigente. Efetivamente, não parece haver dúvida de que as expressões usadas “consentanea” e “universalibus Ecclesiae legibus” usadas no art. 158 sejam equivalente a “congruant” e “iuris vigentis praescriptis” usadas no art. 156. Aqui porém nada se diz a respeito da “recta forma iuridica”.

3.3. A “ratio” desta disposição parece bem semelhante àquela exposta no número anterior.

4. Individuação e assinalação à Autoridade competente de eventuais casos de desaplicação das normas vigentes ou de praxe contrária às mesmas normas.

A competência aqui delineada não está explicitamente contida na Pastor Bonus; no entanto resulta contida ao menos implicitamente na atividade acima ilustrada de examinar se os textos normativos emitidos pelos vários legisladores à Suprema Autoridade sejam ou não côngruas com o direito Eclesial.
La supramencionada capacidade de juízo pode, com efeito, oportunamente reconhecer-se ao Pontifício Conselho também no caso em que, mesmo fora do exame de textos normativos, constasse na praxe uma não conformidade com o direito eclesial, no dúplice senso de desaplicação das normas vigentes o de praxe contrária às mesmas normas.
Nesse caso o Pontifício Conselho estaria habilitado a assinalar à Autoridade competente a supramencionada desconformidade, a fim de que, quem tiver o dever possa intervir com eficácia.
Um caso particular de praxe contrária às normas vigentes ou, por Outras palavras, de não conformidade com o direito eclesial poderia ser o do uso impróprio, por parte da Autoridade, ou da interpretação errônea, por parte da doutrina, de uma certa norma.
Exemplo do primeiro caso poderia ser o – hoje não infreqüente – de se nomear um presbítero não como pároco, mas como administrador paroquial e de deixá-lo neste ofício por um longo tempo, mesmo por anos. O Bispo diocesano comportar-se-ia assim para manter no caso plena liberdade de remoção, mas isto seria contrário à identidade do administrador paroquial, que è, pelo contrário, é uma, una figura transitória.


III
AJUDA AO PAPA NA ATIVIDADE DE RESPOSTA AOS PEDIDOS DE INTERPRETAÇÃO DAS NORMAS CANÔNICAS


Um terceiro, grande âmbito das atividades do Romano Pontífice em relação ao direito eclesial é o que poderiamos define âmbito magisterial ou âmbito doutrinal.
O Pontifício Conselho para os Textos Legislativos presta ao Papa a sua ajuda neste âmbito com dois tipos de serviços: a) a interpretação das normas; b) as intervenções explicativas de questões várias.

1. Interpretação das normas canônicas no âmbito da Igreja universal

Competência não apenas prevista pela Pastor Bonus, como também indicada como a primeira das competências do Dicastério. Eis o ditado legal:
“Consilii manus in legibus Ecclesiae interpretandis praesertim consistit” (art. 154).
“Consilio competit Ecclesiae legum universalium interpretationem authenticam pontificia auctoritate firmatam proferre, auditis in rebus maioris momenti Dicasteriis, ad quae res ratão materiae pertinet” (art. 155).
Parece-me que os dois artigos podem ser lidos conjuntamente e indiquem uma única competência do Pontifício Conselho para os Textos Legislativos, ou seja, a interpretação das normas canônicas.

1.1. É necessário desde logo precisar quais as normas que o Dicastério deve interpretar, o que podemos fazer com as duas seguintes anotações.
a) Embora a Pastor Bonus use o termo “legibus”, não se trata somente das “leis” (cfr. cânn. 7 ss), mas também de Outras normas, de modo particular os “decretos gerais e as instruções” (cfr. cân. 29 ss) e ainda os “estatutos e os regulamentos” (cfr. cânn. 94 ss).
Por este motivo preferimos usar o vocábulo “normas”, que compreende todas as normas elencadas em lugar do termo “leis”, que é mais específico e, per isso mesmo, menos abrangente.
a) Trata-se ademais de normas emitidas pelo Legislador supremo ou pelos Organismos da Cúria Romana. Não se trata pois das normas promulgadas pelos legisladores inferiores.
Por isso escolhemos a expressão “no âmbito da Igreja universal”.

1.2. O Pontifício Conselho interpreta as normas, isto é, indica o seu significado ou, no caso dos textos obscuros, esclarece o seu conteúdo.
A sobredita interpretação pode ser tanto autêntica como simples ou doutrinal.
a) A interpretação autêntica tem como autor o próprio Legislador supremo (cf. cân. 16, § 1), tem força de lei e deve ser promulgada (cf. cân. 16, § 2).
O iter necessário para uma interpretação autêntica pode ser visto como a sucessão de três momentos:
- o Pontifício Conselho formula una interpretação e a propõe ao Legislador supremo
- o Legislador a aprova e então a confirma com a sua autoridade
- o Pontifício Conselho promulga a interpretação.
Note-se que ao desempenhar a atividade de interpretação, o Pontifício Conselho deve ouvir nas matérias de particular importância os Dicastérios da Cúria Romana com competência na matéria que é objeto da interpretação.
Tal iter se deduz da leitura combinada de ambos os textos mencionados, isto é, do art. 155 e do cân. 16.
b) A interpretação simples ou doutrinal tem como autor o Pontifício Conselho para os Textos Legislativos, não tem valore de lei. No entanto goza de autoridade não somente por motivo e na medida das argumentações doutrinais aduzidas, mas também pelo motivo de que é o responso autorizado de um Dicastério da Cúria Romana, que constitui portanto “praxis Curiae” (cf. cân. 19).

1.3. Para cada Dicastério da Cúria Romana o Regulamento Geral prescreve: “Su proposta del Congresso, si trasmetteranno al Pontificio Consiglio per l'Interpretazione dei Testi Legislativi i dubbi che sorgessero, in diritto, sulla interpretazione delle leggi universali della Chiesa....” (art. 120).
Com esta norma o Pontifício Conselho é constituído instância competente para resolver as dúvidas de direito que surgirem ao longo do iter para o tratamento e a definição dos problemas. Trata-se portanto de uma competência diferente da de revisão dos textos definitivos.
Em seguida a isto, o Pontifício Conselho fica à disposição dos Dicastérios para o cumprimento de quanto prescrito.

2. Intervenções explicativas de questões várias

É uma competência não explicitada na Pastor Bonus, mas que já faz entro na praxe do Dicastério.
O Pontifício Conselho para os Textos Legislativos é, às vezes, autor de “declarações” e “notas explicativas”, que têm por fim explicitar melhor a lei, têm valor somente doutrinal e, no entanto, gozam de autoridade come se disse antes, em relação à interpretação simples ou doutrinal.


IV
ATIVIDADES DE PROMOÇÃO DO CONHECIMENTO E DA PRATICA
DO DIREITO CANÔNICO

O Pontifício Conselho entende desempenhar atividades de promoção do conhecimento e da prática do direito canônico, e isto a serviço quer do próprio Dicastério, quer dos estudiosos e dos que atuam no campo do direito canônico. Em relação a este campo, se propõe dois objetivos: 1. Centro de documentação para o conhecimento global do direito canônico; 2. Serviços vários aos canonistas.

1. Centro de documentação para o conhecimento global do direito canônico

O Pontifício Conselho se propõe de criar junto da sede do Dicastério um Centro de documentação o mais completo possível no que tange ao conhecimento do direito canônico em toda a sua extensão.
O Centro deverá, portanto, conter os dados referentes:
a) às normas canônicas:
- da Igreja universal e das Igrejas particulares
- da Igreja latina e das Igrejas Orientais “sui iuris”
- de eventuais normas in fieri
b) à doutrina canonística

O Centro, então, contém:
1) o Arquivo dos documentos da história das duas codificações (latina e oriental) e de outros textos normativos elaborados pelo Pontifício Conselho
2) o Arquivo dos documentos das normas das Igrejas particulares: das Conferências episcopais, dos sínodos diocesanos, de outros legisladores e das Igrejas Orientais sui iuris
3) o Arquivo corrente ou dos dossiês do Dicastério, concluídos ou em curso
4) a Biblioteca especializada: monografias e teses doutorais
5) a Hemeroteca especializada: revistas e instrumentos de documentação

1.1. O Arquivo dos documentos da história das duas codificações (latina e oriental) e de outros textos normativos elaborados pelo Pontifício Conselho
Constitui uma riqueza do Pontifício Conselho porque contém documentos que não se podem encontrar alhures.
Trata-se dos arquivos históricos das várias Comissões Pontifícias competentes em direito canônico. E precisamente dos arquivos: da Pontificia Commissio ad Codicis Canones Authentice Interpretandos, da Commissio Cardinalicia pro studiis praeparatoriis Codificationis Orientalis, da Pontificia Commissio ad redigendum “Codicem Iuris Canonici Orientalis”, da Pontificia Commissio Codici Iuris Canonici Recognoscendo, da Pontificia Commissio Codici Iuris Canonici Orientalis Recognoscendo.
Além dos sobreditos documentos, estão presentes no arquivo os documentos referentes aos outros textos elaborados ao longo dos anos pelo Pontifício Conselho.

1.2. O arquivo das normas das Igrejas particulares: das Conferências episcopais, dos sínodos diocesanos, de outros legisladores e das Igrejas Orientais sui iuris
Contém os documentos das normas produzidas pelas Conferências episcopais e normalmente publicados nos Periódicos oficiais das mesmas Conferências.
É compromisso do Dicastério completar a coletânea de documentos das Igrejas particulares, e portanto dos Periódicos oficiais, superando as atuais lacunas.
O Pontifício Conselho cuidará, outrossim, da catalogação dos documentos de acordo com um índice analítico que permitirá a rápida consulta.
Tudo será paulatinamente informatizado.
Trabalho imane, ainda que não impossível, seria a recolha dos documentos normativos produzidos em nível diocesano, de modo particular nos sínodos diocesanos ou pelo menos produzidos por outros legisladores particulares (concílios regionais ou provinciais).
Trata-se de conhecer a normativa canônica das Igrejas particulares (isto é, das Conferências episcopais e, se possível, dos Concílios particulares e de cada uma das dioceses) e de adquirir os documentos que contém a normativa.
Para este fim o Pontifício Conselho:
a) mantém contato através da Internet com as Conferências episcopais
― para conhecer a normativa progressivamente adotada e normalmente publicada num Boletim oficial
― para conhecer a normativa progressivamente adotada e normalmente publicata num Periódico oficial
― para requerer o envio do mesmo Periódico

b) aproveita a ocasião dos pedidos de parecer em vista da “recognitio” para solicitar ao Dicastério adrede competente que se comprometa a enviar ao Pontifício Conselho o documento definitivo, controlando que isto ocorra.

1.3. O Arquivo corrente ou dos dossiês do Dicastério, concluídos ou em curso.

1.4. A biblioteca especializada; monografias e teses de doutoramento.

É composta de duas partes: a) as monografias; b) as teses doutorais.
É especializada, porque quer limitar-se somente às publicações que tratem de direito canônico. Quer-se igualmente completar.
Trata-se de conhecer as publicações canonísticas (isto é, as monografias e também as teses doutorais) e de adquirir tais publicações.
Para tal fim o Pontifício Conselho:
a) mantém contato, também através da internet, com a editoria especializada e em particular:
- cuida da lista completa das case editoras interessantes o direito canônico, entra em contato com as editoras e segue com regularidade as publicações de novas monografias
- providencia à aquisição de todas as monografias;

b) contata as Faculdades ou os Institutos ou as Cátedras de direito canônico para conhecer as teses, de doutoramento ou de mestrado, que possam mostrar-se interessantes na medida em que possam indicar novas problemáticas e novos campos de investigação, e requer o envio de cópias das mesmas.

1.5. A Hemeroteca especializada: revistas e instrumentos de documentação

O Pontifício Conselho providencia todo o rol das revistas de direito canônico direito canônico ou que publicam freqüentemente estudos canonísticos, e se compromete a seguí-las com regularidade.
Cuida de adquirir todas as revistas que de algum modo se interessam pelo direito canônico através do intercâmbio com Communicationes.

2. Serviços vários aos canonistas

O Pontifício Conselho, ademais, se propõe oferecer aos canonistas vários serviços em ordem à promoção do conhecimento e da prática do direito canônico.

2.1. A fruibilidade dos documentos
O Pontifício Conselho oferece aos expertos o conhecimento dos documentos contidos no Arquivo da história das Codificações e no Arquivo das normas das Igrejas Particulares, bem como do material bibliográfico presente na Biblioteca e na Hemeroteca.
a) Quanto aos documentos conteúdos no Arquivo histórico, ou seja, aqueles das várias Comissões Pontifícias acima enumeradas acima (cfr. IV, 1, 1.1.), o Pontifício Conselho os levou ao conhecimento antes de tudo através da publicação.
Cuidou da publicação dos documentos dos trabalhos para a preparação da codificação latina na Revista Communicationes a partir do primo numero, ou seja, do anno 1969. Iniciou a publicação dos documentos da codificação oriental na mesma.
Está providenciando outrossim à publicação dos documentos dos trabalhos de preparação da “Lex Ecclesiae Fundamentalis” (texto não promulgado).
b) Quanto aos documentos contidos no Arquivo das normas das Igrejas Particulares, o Pontifício Conselho favorecerá o acesso dos estudiosos à consulta direta dos documentos, usando também o índice analítico adrede predisposto, ou à consulta informática dos mesmos.
c) O Pontifício Conselho assume de bom grado o compromisso de oferecer aos expertos o acesso à Biblioteca e à Hemeroteca.
Compromete-se a redigir um índice analítico dos artigos contidos nas Revistas da Hemeroteca.
Pretende oferecer em particular uma coletânea, na medida do possível atualizada, de teses doutorais em direito canônico fornecidas por todas as Faculdades com as quais o Dicastério está em constante contato.

2.2. A revista Communicationes
a) A Revista Communicationes editada pelo Pontifício Conselho desde 1969 quer ser o segundo serviço específico para a promoção do direito eclesial e para a utilidade de estudiosos e operadores.
O fim da Revista não é tanto doutrinal, ou seja, de publicar estudos, quanto documentário, isto é, de dar a conhecer documentos de normativa canônica ou trabalhos de preparação da mesma normativa ou ainda atos da Autoridade, sobretudo em nível central.
A Revista é publicada duas vezes por ano.
b) Um serviço especial ao direito eclesial e aos expertos do setor, serviço que o Pontifício Conselho considera como próprio, é a publicação em Communicationes dos documentos que durante o semestre foram produzidos pelos vários Organismos da Cúria Romana, mesmo os documentos mais ínfimos. Tais documentos são hoje publicados de modo esparso nos vários órgãos de imprensa (AAS, L’Osservatore Romano, Boletins dos Dicastérios).
O serviço do Pontifício Conselho entende consistir precisamente na publicação reunida e na publicação completa dos textos em questão. Tais textos se encontrariam assim fácil e rapidamente, sem necessidade de consultar várias fontes.

2.3. Outras pubblicações
O Dicastério se propõe promover o conhecimento e sobretudo a aplicação do direito canônico com pubblicações de caráter divulgativo e que favoreçam a prática, sobretudo dos párocos e dos que trabalham nas Cúrias ou nos Tribunais.
Muito pedidos são os formulários, que permitam evitar erros de procedimento e dar unidade ao modo de proceder prático acerca dos atos administrativos.

2.4. Outras iniciativas para a promoção do conhecimento e da prática do direito canônico
É intenção do Pontifício Conselho convocar reuniões ou simpósios com finalidades não puramente doutrinais, mas eminentemente operativas, ou seja, com o intento de examinar a situação de certas partes do direito eclesial e de proporre então soluções práticas.
Igualmente se tem a intenção de ajudar na aplicação da normativa mediante vademecum e formulários.

2.5. Rapporti com as Conferências episcopais
O Pontifício Conselho cuida sobretudo dos seguintes pontos:
a) O encontro com os representantes das Conferências episcopais nas Visitas ad lìmina em que o Pontifício Conselho faz presentes as questões referentes ao direito canônico.
b) O completo cumprimento da produção das normas complementares ao Código.
c) Várias iniciativas de colaboração para a promoção do direito canônico.

V
I CONSULTORES

Para levar a cabo as tarefas acima ilustradas, o Pontifício Conselho necessita da colaboração dos seus Consultores.

1. Os Consultores do Dicastério são os expertos em direito canônico, os estudiosos e os que atuam na área.
Para fins de utilidade prática, podemos distinguir entre os Consultores em sentido estrito (ou seja, aqueles que estão inscritos nos rol do Anuário Pontifício) e os Consultores em sentido lato (os expertos em geral, isto é, os expertos considerados na sua globalidade). Mesmo que os primeiros sejam Consultores por um título especial, todos os demais podem oferecer uma preciosa ajuda ao Pontifício Conselho.

2. A colaboração que o Dicastério pede aos seus Consultores consiste em ajudá-lo a levar a cabo as atividades amplamente ilustradas nas páginas anteriores. Portanto a atividade dos Consultores se desdobra nos seguintes serviços, que podemos indicar simplesmente repassando os passos do exposto nas páginas acima:
a) na atividade de legislação, os Consultores contribuirão:
- na individuação ou a assinalação das “lacunae iuris” o das obsolescências das normas com propostas de intervenção
- com a redação de esquemas normativos por parte do Pontifício Conselho
b) na atividade de vigilância e portanto de garantia da correta aplicação do direito eclesial, os Consultores contribuirão:
- no exame dos documentos normativos submetidos à apreciação do Dicastério
- na individuação ou assinalação de eventuais casos de desaplicação das normas vigentes ou de usos contrários às normas mesmas
c) na atividade de resposta aos pedidos de interpretação das normas canônicas, os Consultores oferecerão um contributo doutrinal de imediata evidência
d) enfim na promoção do conhecimento e da aplicação do direito canônico, serão igualmente uma ajuda insubstituível.
Considerando o exposto, os Consultores oferecem ao Pontifício Conselho dois gêneros de serviços: de conhecimento e de conselho. De conhecimento, isto é, disponibilização de dados referentes à normativa canônica ou à doutrina canonistica (de modo específico no setor em que é especializado ou de acordo a região em que reside); conselho, isto é, preparação de pareceres para o desempenho das várias atividades pertinentes ao Pontifício Conselho.
Os Consultores poderão prestar os serviços supra-indicados quer a título pessoal quer nas estruturas previstas, como por exemplo as Consultas.

3. O Pontifício Conselho propõe-se tornar ainda mais eficaz o serviço dos seus Consultores mediante duas estratégias.
Uma primeira é a de parcelar – por assim dizer – o conjunto do direito eclesial seguindo sobretudo o Código e logo atribuir a cada porção uno o mais Consultores especialistas naquela questão. Com esta estratégia, o Pontifício Conselho será ajudado com particular eficácia. Quando, com efeito, terá necessidade de receber consultorias em questões particulares, poderá facilmente e portanto rapidamente individuar os expertos na questão determinada e consultá-los tempestivamente.
A segunda estratégia é a de ter Consultores – digamos – “territoriais”, isto é canonistas que residem em várias regiões e, por isso, conhecem de modo direto as peculiaridades e as necessidades daquelas regiões. Com este sistema, o Pontifício Conselho será ajudado, também aqui, com particular eficácia. Quando, com efeito, terá necessidade de procurar dados ou de obter conselhos quanto a uma região específica, especialmente nos casos de exame de normas ou vigilância sobre a praxe de Igrejas particulares ou a obtenção de normas das Igrejas particulares, o Pontifício Conselho poderá com grande utilidade valer-se das informações o dos pareceres de um Consultor habitante naquela região.

4. O Pontifício Conselho propõe-se ter o conhecimento pessoal e direto dos expertos in direito canônico e logo de cultivar os contatos necessários.
Em vista do conhecimento pessoal e do óbvio pressuposto de que os expertos in direito canônico possam encontrar-se particularmente nas Faculdades de direito canônico ou nas Associações canonísticas, o Pontifício Conselho mantém rol dos canonistas pertencentes às Faculdades e às Associações.
Com o intuito de manter contatos diretos, o Pontifício Conselho, por um lado, favorece visitas ao Dicastério e, por outro, programa visitas nas várias sedes acadêmicas ou nos vários congressos canonísticos.
Com estes contatos o Pontifício Conselho se propõe principalmente apresentar-se aos expertos e favorecer as relações recíprocas. Em outras palavras, propõe-se dizer que, sendo o Pontifício Conselho a instituição central para servir o Papa e a Igreja no serviço ao direito eclesial como se especificou antes, o Pontifício Conselho tem necessidade da ajuda dos expertos e os expertos se sintam obrigados a dar a própria contribuição às atividades do Pontifício Conselho.

CONCLUSÃO

Apresentamos de modo analítico as múltiplas competências do Pontifício Conselho para os Textos Legislativos. Estas atividades são todas, como tem sido lembrado, de ajuda ao Papa no exercício do seu ministério ao serviço à Igreja universal.
Podemos agora citar o que Benedetto XVI expressou em relação à identidade e à função do Pontifício Conselho para os Textos Legislativos, no discurso pronunciado dia 25 de janeiro de 2008 por ocasião das comemorações do XXV aniversário da promulgação do Código de Direito Canônico: “...il Pontificio Consiglio per i Testi Legislativi è chiamato ad essere di aiuto al Romano Pontefice, supremo Legislatore, no suo compito di principale promotore, garante e interprete del diritto nella Chiesa.” (cfr. L’Osservatore Romano, 26 giugno 2008, p. 5).
(*)Palestra proferida em julho de 2011 em LONDRINA - PR, no XXVI ENCONTRO DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE CANONISTAS e XXVIII ENCONTRO DOS SERVIDORES DOS TRIBUNAIS ECLESIÁSTICOS DO BRASIL - por S.Excia.Revma.Dom Francesco Coccopalmerio - Arcebispo Titular de Coeliana e Presidente do Conselho para os Textos Legislativos do Vaticano.